Laicidade no Nepal?
Tendo sido restaurado com poderes constituintes na sequência das manifestações populares de Abril, o parlamento do Nepal decidiu no dia 18 de Maio que o hinduísmo deixará de ser a religião de Estado. Foi também decidido transformar o monarca numa figura meramente decorativa (sem imunidade judicial, isenções fiscais ou controlo sobre o exército), abalando assim os fundamentos do regime monárquico-clerical.
Os 27 milhões de nepaleses incluem cerca de 80% de hindus, 11% de budistas, 4% de muçulmanos e uma grande diversidade de religiões tradicionais, línguas e etnias. O rei do Nepal (que pertence a uma dinastia que governa este país dos himalaias há mais de duzentos anos) é tradicionalmente considerado pelos hindus a encarnação de Vishnu (um dos três deuses mais importantes numa mitologia que inclui vários milhões de divindades). O clericalismo hindu tem servido para legitimar o sistema de castas e a discriminação das mulheres e dos não hindus. O proselitismo está proibido, muitas igrejas cristãs não se conseguem legalizar, e matar vacas, mesmo que se tenha muita fome, é ilegal e resulta numa pena de prisão.
Nos últimos dias, após críticas de hindus fundamentalistas, manifestações de protesto contra a laicização do único Estado oficialmente hindu do mundo foram promovidas, apoiadas por organizações hindus extremistas da Índia, em quatro dos 75 distritos do Nepal. O líder do partido indiano BJP (hindus conservadores) lamentou a decisão, argumentando que se está a colocar em causa «a identidade» do Nepal.