Petro-fundamentalismos
Lyman Stewart (1840-1923) presidente da Union Oil Company e um dos fundadores da Biola University (Bible Institute of Los Angeles), co-autor e financiador dos «The Fundamentals», os textos que cunharam o termo fundamentalismo.
Pensar-se-ia à primeira vista que o tema do post seria um contrasenso, isto é, que petróleo e religião seriam palavras inesperadas na mesma frase.
Na realidade, o ressurgir anacrónico dos fundamentalismos religiosos e das guerras da religião está intimamente ligado ao ouro negro. Não só porque o petróleo está associado ao Islão radical, Arábia Saudita e Irão, dois dos países que surgem imediatamente da associação, como boa parte dos movimentos fundamentalistas islâmicos são suportados por petrodólares, fonte de financiamento igualmente da expansão preocupante do Islão nas zonas mais pobres de África. As madrassas wahabitas, com fundos sauditas quasi ilimitados, são em muitos locais a única fonte de alimentação, cuidados básicos de saúde e educação para a população. E incubadoras de fanáticos dispostos a dar a vida por honra e glória do profeta.
De igual forma, a associação petróleo e fundamentalismo (cristão) é especialmente válida nos Estados Unidos, já que o próprio termo fundamentalismo deve o seu nome ao dinheiro do petróleo. De facto, a publicação da série de 4 livros, «The Fundamentals», publicados em 1909 pelo Bible Institute de Los Angeles (BIOLA) foi financiada com petrodólares por um dos fundadores do BIOLA, Lyman Stewart, presidente e fundador da Union Oil Company of California (agora a UNOCAL/Chevron) .
A correlação actual petróleo-fundamentalismo islâmico pode estar a mudar drasticamente, na opinião do analista político Michael Weinstein daqui a menos de duas semanas. Caracas será anfitriã da próxima Conferência extraordinária da OPEC e espera-se que no decurso desta reunião Hugo Chavez anuncie que a Venezuela é agora o país mais rico em petróleo do mundo, com reservas muito superiores às da Arábia Saudita.
De facto, Chavez assenta parte da sua oposição à influência americana na América do Sul na sua fé católica. E parece quase tão certo quanto Bush que a sua actividade política tem uma inspiração divina. Mas o seu Deus católico é um Deus socialista que se opõe ao Deus capitalista evangélico de Bush. Um Deus que procura aliados não nos poderes conservadores cristãos emergentes, quasi teocracias, como a Polónia ou a Ucrânia na Europa e os Estados Unidos no continente americano, mas sim nos países em que a teologia da libertação foi marcante há umas décadas (antes de ser violentamente suprimida pelo Vaticano) e há uma inédita base de apoio cristã a políticas de esquerda. Países como a Venezuela, Argentina, Chile (não obstante a sua presidente, Michelle Bachelet ser ateísta), Bolívia, o Brazil e até Cuba (em que Fidel Castro parece quasi um cristão renascido em alguns discursos).
Weinstein aponta ainda que este bloco socialista católico pode ascender no continente americano se nas eleições de Julho próximo o anterior presidente da câmara da Cidade do México, Andre Manuel Lopez Obrador, for, como parece provável, eleito presidente mexicano em substituição de Fox. Obrador tem sido erradamente considerado um cristão evangélico pela frequência com que recheia discursos oficiais com o nome do mítico fundador do cristianismo. Na realidade, Obrador é um católico que tem o apoio dos bispos mexicanos, não obstante ter recusado que sejam estes a decidir as políticas de saúde (leia-se contracepção e aborto) do país no caso de ser eleito. A mesma posição de Chávez, que tantas críticas tem merecido das cúpulas católicas.
O preocupante nesta história é que o Vaticano, com séculos de experiência em relações internacionais e manipulação política, já se apercebeu há muito desta alteração geopolítica. Como indica a recente reunião de Ratzinger com Chávez! E tem em marcha uma série de cartadas que tentarão ser o Vaticano quem ditará os termos de um próximo petro-fundamentalismo!