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Porque sou ateu

Deus pode existir ou não existir.
O Pai Natal pode existir ou não existir.
Em volta de Plutão pode orbitar uma lata de Ice Tea ou não orbitar.

Se Deus não existir, faz todo o sentido que o mundo seja como é.
Há algumas questões profundas cuja resposta não concebo (o mistério da criação) mas às quais a religião também não responde de forma satisfarória.
De resto, se não existisse Deus, como seria o mundo? Como é.
A natureza, regulada por leis indiferentes aos valores e à ética de consciências cheias de sentimentos, desenvolveria aspectos revoltos, harmoniosos, violentos, desenvolveria e destruiria equilíbrios. Na esmagadora maioria dos planetas não existiria vida, e naqueles em que existisse, ela estaria sujeita às leis da selecção natural.
Seria natural que existissem bactérias, fungos, parasitas de toda a espécie. Seria natural que existissem animais que comem os seus filhos; seria natural que existissem gigantescas guerras, uma luta violenta pela sobrevivência; seria natural a doença, a extinção de diversas espécies. Seria natural o carinho, o amor entre animais de consciência mais evoluída (como acontece entre muitos mamíferos e não só).
A aparecerem seres humanos, ou seres vivos similares, seria natural que conseguissem usar instrumentos, inventar a escrita, manipular o mundo em seu redor. Seria natural o altruísmo, o egoísmo, o Amor e a maldade. Seria natural a guerra, a arte, a literatura, o racismo, o ódio, a intolerância, a fome, a entre-ajuda, a Ciência.
E seria natural que surgissem vários mitos, várias religiões. Com crentes convencidos de que as restantes religiões estão erradas, sem se convencerem pelos alegados milagres destas últimas, reconhecendo facilmente a fraqueza de tais indícios.

Mas se Deus existisse… o mundo deveria ser muito diferente.
Imaginemos o Deus da mitologia cristã, por exemplo.
Como explicar que um Deus perfeito que tanto nos ama tenha criado o Inferno onde, segundo está escrito na Bíblia, a esmagadora mairia das pessoas vai sofrer terrivelmente por toda a eternidade? Como explicar que esse castigo é justo, quando nenhum crime merece tal pena?
Raios! Eu até sou contra a pena de morte! Mas consta que o sofrimento no Inferno é bem pior que qualquer tortura física (como as da inquisição…). O criador de tal justiça poderia ser um «Deus de Amor»?

Há crianças que morrem com muito sofrimento à nascença. Deus teria criado um mundo em que a sua experiência de vida foi um grito de dor. A razão das mortes, da doença, da velhice, teria sido a escolha de Adão. Bonita alegoria, essa que condena a humanidade por ter provado o fruto do conhecimento, é do mais obscurantista que pode haver. Mas continua imperceptível a culpa da criança. Essa «culpa colectiva» à luz de um ser perfeito e justo, faz algum sentido? E as catástrofes, terramotos e tsunamis, que matam milhares de ser criados à “imagem e semelhança de Deus”? Também são culpa do pecado que colectivamente cometemos? Que sentido é que isto faz?

Se Deus me deu liberdade para escolher entre o bem e o mal, gostaria que a minha escolha fosse devidamente informada. Que custaria a um ser omnipotente que nos amasse explicar a cada um de nós as consequências dos nossos actos? Mostrar-me o Inferno, e explicar-me com muita clareza o que é o mal.
Sim, porque se eu fosse a seguir os conselhos da Igreja, bem podia ter morto vários soldados árabes no sec XII… Se a Igreja falha porque «é humana» (como os escândalos de pedofilia nos EUA bem o provam), porque é que Deus, que alegamente nos ama tanto, se arrisca a que façamos o mal, pensando que estamos a fazer o bem? Se arrisca a que morram os tais soldados árabes do séc XII? Dá muito trabalho aparecer? Gasta algum combustível?

Imaginemos o trabalho dos missionários quando chegaram a África. Eles acreditavam que estavam a dar àquelas pessoas a oportunidade de se salvar? Que os seus ascendentes arderiam no Inferno porque tinham tido o «azar» de não terem tomado contacto com os missionários? Que um Deus justo procederia dessa forma?

A Bíblia é muito clara: só por Cristo se chega ao Céu. Mas conhecer Cristo é em grande parte uma questão de sorte, e cerca de metade da população mundial não tem essa oportunidade. Que Deus justo planifica as coisas desta forma? Há alguma justiça nisto? Porque é que Jesus não aparece aos Chineses e Indianos? Desde a vinda de Jesus, houve gerações, centenas de pessoas, que nem com missionários tiveram contacto. São menos que os outros? Não merecem o Paraíso? Que justiça é esta?

Não. A Santíssima Trindade não faz sentido. É um excelente exemplo de Duplipensar.

Se um Deus justo e cheio de Amor, o natural seria que a cadeia alimentar não funcionasse como funciona. Que os Leões não tivessem de provocar rotineiramente cruel e derradeiro sofrimento nas gazelas para poderem sobreviver.
O natural seria que as bactérias não existissem, e que a vida consciente não estivesse sujeita a doenças e sofrimento arbitrário.
O natural seria que ninguém sofresse injustamente.

O natural seria que os ateus não existissem. Deus teria encontrado forma de se revelar a todos.
Mas por azar, quando Deus «se dá ao trabalho» de pôr o Sol às voltas em Fátima, em frente a vários milhares de pessoas, esqueceu-se de permitir que as máquinas fotográficas registassem o fenómeno. E esqueceu-se de muitos dos que lá estavam, também, visto que grande parte dos presentes não viu nada, para já não falar no resto da humanidade para quem o Sol (é o mesmo!) ficou quieto no seu lugar. Tudo isto seria fácil de explicar se Deus não existisse…

O natural seria que não existissem várias religiões completamente análogas, todas com mensagens religiosas de ódio em relação às outras – este ódio mútuo, inscrito nos diversos livros sagrados, seria naturalíssimo se nenhum Deus existisse – e é o que acontece!

Enfim…
Se Deus não existisse, o natural seria que o mundo fosse como é.
Se Deus existisse, seria muito bizarro que o mundo fosse como é.
Mas o mundo é como é…

Voltarei a este tema.

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