Sex, Priests, and Secret Codes
Enquanto por todo o mundo se espera a estreia do filme inspirado no livro «O código de da Vinci», ficção que mereceu os mais inusitados protestos da hierarquia católica, é lançado um livro, «Sex, Priests, and Secret Codes: The Catholic Church’s 2,000-Year Paper Trail of Sexual Abuse», que expõe a realidade de um segredo até há poucos anos ciosamente guardado pela mesma hierarquia, que não se poupou a esforços para o esconder e, agora que é impossível o secretismo, se desdobra em manobras para o desvalorizar.
O segredo tão ciosamente guardado é a pedofilia em particular e o abuso sexual em geral, exposto pelo padre dominicano Thomas P. Doyle, despedido em 2004 pelo arcebispo Edwin F. O’Brien, um dos mais conhecidos críticos da actuação da Igreja Católica no encobrimento de casos de pedofilia no seu seio.
Doyle, que foi o representante do Vaticano nos Estados Unidos no ínicio dos anos oitenta, foi um dos autores de um relatório entregue aos bispos norte-americanos em Junho de 1985, que os advertia das dimensões do abuso sexual perpetrado por padres.
Muitos católicos ficaram escandalizados não apenas com as dimensões mas especialmente com a reacção da hierarquia católica. Não só com o facto de que a Igreja justifica as manobras de vale tudo dos advogados que contrata afirmando que tem obrigação de proteger o património da Igreja, isto é, mostrando-se mais preocupada com o dinheiro que sairá dos seus cofres em indemnizações do que com as barbaridades cometidas às vítimas, como com a recusa da hierarquia católica em admitir o problema real da pedofilia.
Usando as manobras de vitimização já conhecidas, as cúpulas católicas tentam fazer passar a mensagem que tudo não passa de manobras de anti-católicos que querem «prejudicar» a ICAR. Apenas como exemplos dessa reacção recordamos que o actual Papa afirmou «Estou convencido que as notícias frequentes sobre padres católicos pecadores [pedófilos] fazem parte de uma campanha planeada para prejudicar a Igreja Católica», o cardeal Justin Rigali, de Filadélfia, considera que o extenso relatório dos abusos sexuais compilado pelo Ministério Público local foi obra de anti-católicos e que o periódico jesuíta La Civiltà Cattolica resumiu a mensagem das cúpulas católicas escrevendo que o tratamento do escândalo da pedofilia pela imprensa norte-americana reflecte um crescente sentimento anti-católico nos Estados Unidos.
O livro, escrito em conjunto com dois ex-monges dominicanos, A.W.R. Sipe e Patrick J. Wall, desmente categoricamente todas as afirmações da Igreja e fornece documentação extensa -muita da qual nunca antes publicada – que mostra que o abuso sexual de menores e adultos vulneráveis não só abrange toda a história da Igreja católica como tem sido do conhecimento da hierarquia ao longo dos séculos.
O livro, e a documentação em que assenta, ilustra quão bem a Igreja conhece este problema e as suas tácticas, que resultaram durante séculos, para o manter em segredo.
Contrariamente ao que muitos dignitários pretendem, quando as manobras de desvalorização do problema não funcionam, o abuso sexual não tem rigorosamente nada a ver com pretensas consequências da secularização do século XX ou de quaisquer «revoluções» culturais/sexuais dos anos sessenta ou setenta. É um problema intrínseco e indissociável da Igreja católica desde a sua criação por Constantino.
Os autores começam a pesquisa no ano 60 e terminam com o escândalo contemporâneo. Os dignitários da Igreja clamaram então o seu desconhecimento desta conduta mas o livro agora publicado indica claramente que mesmo uma análise superficial dos documentos da Igreja prova que não só tinham conhecimento total do que se passava como recorreram a todas as tácticas disponíveis para proteger a imagem (e o bolso) da Igreja.