5 de Abril, 2006 pfontela
Crítica ao «tratado de ateologia»
Michel Onfray é provavelmente um dos escritores ateus que mais vende na Europa e a cada nova publicação tem direito a uma cobertura mediática completa. O seu último título não é excepção; o «tratado de ateologia» (disponível em francês e espanhol).
Primeiro é preciso começar por definir o que a obra é e não é. Não é um tratado filosófico porque Onfray não se dedica a desenvolver nenhum argumento de forma completa e coerente, limitando-se a referir de “raspão” as conclusões de outros autores. Não é um tratado histórico porque não existe uma linha lógica de investigação histórica que guie o livro, apenas referências (muitas…) às intermináveis incoerências de ter uma religião que se diz racional e os inenarráveis crimes que povoam a história do monoteísmo. Ou seja, para o leitor que procura uma discussão aprofundada dos temas este definitivamente não é livro recomendado, é demasiado disperso e superficial para preencher os requisitos.
Agora vamos falar do que o livro é. Para mim fica-me a ideia de uma obra digna de um publicista, ou seja, o seu principal objectivo é vincular uma determinada opinião e com esse objectivo usa-se uma linguagem agressiva mas sem grande profundidade. Quem tiver dois dedos de testa e não for ateu não será com certeza com esta obra que se tornará e mesmo ateus (por muito militantes que sejam) que partilhem de muitas das opiniões de Onfray provavelmente não gostarão da forma como ele as expõe, o seu estilo é presunçoso, arrogante mas inconclusivo.
Em resumo é uma obra para quem precisar de um catálogo de argumentos e de inconsistências religiosas mas não para quem quiser adquirir conhecimentos aprofundados sobre todos os temas.
Uma outra forma de analisar o livro é como um grito de profunda e genuína indignação contra um conjunto de fés que têm o seu passado escrito em sangue e que hoje escolhem vestir a pele do cordeiro, chegando ao cúmulo da hipocrisia de se apresentarem como soluções para os “males da modernidade” – problemas esses, que quando existem, são em grande parte derivados das suas próprias acções no passado e presente. Se escolhi partilhar primeiro a visão que realça as falhas do livro é porque pessoalmente o livro desiludiu-me. Esperava um trabalho muito mais profundo, especialmente no tema do desenvolvimento da ética ateísta, coisa que não ocorreu.
Por fim deixo aqui a estrutura do livro:
Parte 1: ateologia
– A odisseia dos espíritos incrédulos
– O ateísmo e saída do niilismo
– Em direcção a uma ateologia
Parte 2: Monoteísmos
– Tirania e servidão nos mundos subjacentes
– Autos de fé da inteligência
– Desejar o contrário do real
Parte 3: Cristianismo
– A construção de Jesus
– A contaminação Paulista
– O estado totalitário cristão
Parte 4: Teocracia
– Pequena teoria da selecção de citações
– Ao serviço da pulsão de morte
– Por um laicismo pós-cristão