8 de Março, 2006 lrodrigues
A Mulher Católica
O dia 8 de Março é o «Dia Internacional da Mulher».
(Publicado simultaneamente no «Random Precision»)
O dia 8 de Março é o «Dia Internacional da Mulher».
(Publicado simultaneamente no «Random Precision»)
Nutro pelos dias do calendário, que a sociedade de consumo reverencia, saudável horror e o desprezo mais visceral.
No dia da mulher vacilo e soçobro. Evoco mãe e irmã e esmoreço; lembro companheira e amiga e descoroçoo. Lembro as mulheres, vítimas de todas as épocas, e enterneço-me.
Recordo a oração matinal dos judeus que convida os homens a bendizer Deus por tê-lo feito judeu e não escravo…nem mulher. Recordo a Tora que decidiu a inelegibilidade [da mulher] para funções administrativas e judiciárias e a incapacidade de administrar os próprios bens.
Lembro a submissão que o islão impõe, a burka que lhe cobre o corpo e oprime a alma, a lapidação, as vergastadas e a excisão. Os machos são superiores às fêmeas, «porque Deus prefere as homens às mulheres (IV, 34)».
A cultura judaico-cristã é misógina, submete e explora a mulher. Destina-lhe a cozinha e a procriação, a obediência e a servidão. É a herança que Abraão lhe deixou.
Quando a mulher irrompeu com a força contida por séculos de opressão, avançou nas artes, na ciência e na cultura, com o furor do vulcão que estoirou os preconceitos.
Antes do 25 de Abril, em Portugal, a mulher carecia de autorização do marido para transpor a fronteira, não tinha acesso à carreira diplomática ou à magistratura, nem à administração de bens próprios.
Não há países livres sem igualdade entre os sexos.
A libertação da mulher é uma tarefa por concluir, contra o peso da tradição, a violência dos homens, o abuso das Igrejas e os preconceitos da sociedade.
Hoje, dia internacional da mulher, é dia para, homens e mulheres, pensarmos que somos iguais. Todos os dias. Em qualquer lugar. Sempre.
Publicado simultaneamente no «Ponte Europa»
José Policarpo inseriu novamente um pronunciamento político numa «homilia» (uma actividade que se supõe exclusivamente «espiritual»). Desta feita, o Cardeal-Patriarca formulou um pedido (ver mais acima), mas de uma forma (intencionalmente?) ambígua: não é claro se deseja uma lei que limite a liberdade de expressão criminalizando a blasfémia, ou se quer apenas que as pessoas se coíbam de exercer a sua liberdade quando isso lhe possa desagradar. Em qualquer dos casos, impôs limites aos que não cedem à «facilidade» de acreditar em «Deus»: não se pode troçar, diz ele, de «Deus», da «fé» e do «sagrado». O totalitarismo implícito no pedido é claro: Policarpo quer impôr a sua concepção do sagrado mesmo a quem não crê, e não exclui exigir leis que o ajudem nesse propósito (como, aliás, acontecia durante a Inquisição…). É caso para recordar que é fraca a fé que tem de ser protegida, pelas leis, de ideias contrárias, pois se fosse forte não necessitaria de exigir a quem não a partilha que se abstenha de a criticar.
O Diário as Beiras (3/3/06) publicou uma carta do leitor Cheikh Brahim Abdellahi, sob o título «Em defesa de humanidade, profeta MOHAMED, paz esteja com ele», dirigida ao primeiro-ministro dinamarquês Anders Fogh Rasmussen, em que condena as caricaturas de Maomé e lhe exige, sem atraso, «que apresente desculpa não só ao mundo muçulmano, mas também a toda a humanidade, porque o profeta MOHAMED, a paz esteja com ele, representa a conclusão de todos os valores humanos nobres e que são respeitados por qualquer ser humano equilibrado».
Respeito as minorias mas respeito ainda mais, louvado seja o livre-pensamento, a verdade e a liberdade. Defendo os crentes mas reservo-me o direito de combater as crenças, louvado seja o livre pensamento.
Assim, permito-me esclarecer o devoto Cheikh de alguns equívocos:
1 – O primeiro-ministro dinamarquês é certamente leitor assíduo do «Diário as Beiras» mas não vai responder à sua exigência pelo facto de não poder, nem querer, abolir a liberdade de imprensa;
2 – Apesar do respeito que merece o profeta Maomé, louvado seja o livre-pensamento, as sociedades democráticas preferem o respeito pelos direitos humanos;
3 – O direito à liberdade de expressão é mais sagrado do que a alegada vontade de Maomé, Cristo ou Moisés;
4 – Em democracia a fé é facultativa, contrariamente à teocracia onde é obrigatória, e defende-se a liberdade de todas as religiões, bem como do agnosticismo e do ateísmo.
5 – Nos países laicos e democráticos ninguém é perseguido por razões religiosas e o direito de abandonar ou abraçar qualquer religião é defendido pelo Estado de direito.
Quanto aos valores humanos nobres, que invoca para Maomé, convém ter em conta:
I – Não são respeitados por todos os seres humanos equilibrados, como alega;
II – A democracia e a laicidade do Estado não são consentidas nos países muçulmanos;
III – O respeito pela igualdade entre os sexos não existe;
IV – A Declaração Universal dos Direitos do Homem é ignorada;
V – A decapitação, lapidação e tortura são práticas correntes.
Os Árabes que contribuíram para o humanismo e favoreceram o Renascimento europeu eram, então, mais tolerantes e cultos do que os cristãos mas, agora, regrediram e dão ao mundo exemplos de intolerância e fanatismo.
Não há, pois, uma guerra de civilizações. Há um antagonismo entre o islão político, de contornos fascistas, e a democracia, uma luta entre a civilização e a barbárie, um conflito entre a fé e a liberdade. Louvado seja o livre-pensamento.
Publicado simultaneamente no «Ponte Europa»
Em Novembro escrevi um post que relatava como o presidente do Departamento de Estudos Religiosos da Universidade do Kansas (KU), Paul Mirecki, farto das IDiotias que assolam o estado, ofereceu uma disciplina com o título «Tópicos especiais em Religião: Desenho Inteligente, Criacionismo e outras Mitologias Religiosas».
A posição de Mirecki, e de muitos mais docentes da Universidade, é, como seria normal, que «O criacionismo é mitologia. O desenho inteligente é mitologia. Não é ciência. Eles tentam fazê-lo passar por ciência. Mas obviamente que não é».
Hoje recebi um mail de uma das minhas amigas americanas que foi à KU dar uma conferência e me pôs ao corrente dos desenvolvimentos da temerária acção de Mirecki.
Os fundamentalistas cristãos do Kansas não gostaram do novo curso proposto, que ofendia as suas crenças religiosas, nem da troca de mails de Mirecki com um grupo de estudantes fundamentalistas cristãos, alguns com uma linguagem um pouco mais arrojada, é um facto, nomeadamente o que referia que o curso seria «uma estalada» na «cara gorda dos fundamentalistas», mas eram mails privados. Tornados públicos por um conservador pelo menos igualmente … sem papas na língua, que costumava referir a na época primeira dama Hillary Clinton como… Hitlary!
Dois fanáticos cristãos resolveram mostrar a sua indignação em relação às ofensas à sua fé e crenças. Mirecki foi espancado em Dezembro, menos de um mês depois do anúncio da nova disciplina!
Uns dias depois, Mirecki foi forçado a demitir-se da sua posição embora a KU, afirme que a decisão, assim como o cancelamento do curso, foi «voluntária». Mirecki no entanto afirmou que «A Universidade penalizou-me e negou-me os meus direitos constiticionais de falar e expressar a minha opinião», afirmando ainda que a sua carreira foi arruinada pelos fundamentalistas cristãos.
Pelo que a minha amiga me contou parece que a Cleveland Indy Media Center só não acertou no ponto de interrogação quando descreveu o ocorrido num artigo intitulado «Terror fascista no Kansas?»
Um dos primeiros actos de Samuel Alito, o ultra-conservador católico recentemente confirmado para uma posição (vitalícia) no Supremo Tribunal norte-americano, foi enviar uma nota a James Clayton Dobson, o influente teocrata que fundou e dirige a organização fundamentalista Focus on the Family.
Na carta, Alito agradece a Dobson todo o apoio que este e a organização que dirige lhe prestaram e promete que «durante o tempo que estiver no Supremo Tribunal [isto é, até morrer] terei presente a confiança em mim depositada”.
A organização Americans United for Separation of Church and State, que considera que esta carta é mais uma prova que o mais recente Opus Dei no Supremo está no «bolso» dos teocratas, já protestou o respectivo teor.
«O Juíz Alito deveria seguir a Constituição e não as ordens de Dobson e dos teocratas» afirmou o Rev. Barry W. Lynn, o director executivo da Americans United. «Esta nota sugere fortemente que Alito tem uma agenda de extrema-direita em vez de ser um juíz para todos». «É obscenamente desadequada. Alito parece um candidato político numa volta vitoriosa em vez de um juíz justo e independente».
Infelizmente a confirmação de Alito para o Supremo era indicação evidente das objecções agora expressas. Os Estados Unidos estão em risco de se transformarem numa teocracia cristã…
A Universidade de Charleston, na Virginia, uma instituição privada não-religiosa, alterou os termos de um anúncio de recrutamento para um professor de ética, depois do primeiro anúncio que exigia um docente que «deve apresentar uma crença em Deus e apresentar valores éticos e morais com uma perspectiva centrada em Deus» ter sido considerado em violação do artigo VII do Civil Rights Act.
Ian Ayres, da Yale University Law School e perito em direitos civis, afirmou na terça-feira, um dia depois do dito anúncio ter aparecido, que o anúncio era discriminatório em termos de religião e como tal uma violação dos direitos civis de ateus, agnósticos e crentes em religiões ateístas (como o budismo), opinião corroborada por Erwin Chemerinsky, um professor de direito na Duke University, que afirma que a nova redacção de angariação de pessoal docente é mais segura em termos legais.
Claro que a necessidade de não discriminação com base na religião se aplica apenas a instituições não religiosas. As Universidades confessionais podem discriminar à vontade desde que as «regras» para a discriminação religiosa sejam públicas. E estas regras não implicam apenas que ateus e agnósticos sejam personas non gratas no campus…
Por exemplo, no início do ano o Wheaton College em Illinois despediu um professor de Filosofia, Joshua Hochschild, depois de este se ter convertido ao catolicismo.
Nesta Universidade os docentes são obrigados a assinar uma declaração de fé que, de acordo com a «Missão» da instituição, é um sumário da doutrina bíblica em acordo com o cristianismo evangélico e enumera as crenças que todos os funcionários devem ter: o Antigo e Novo testamentos «são completamente verdadeiros e de autoridade suprema e final», o nascimento livre de pecado original de Jesus (a virgindade de Maria, não o dogma da Imaculada Concepção, um dogma católico) é inquestionável assim como a existência de Satanás, a criação por Deus de Adão e Eva e a dentadinha na maçã na base do pecado original e da «Queda», etc..
O despedimento de Hochschild, que se declarou disposto a seguir esta declaração de fé, baseou-se no facto de a sua conversão violar a crença de que apenas as escrituras ( e não a exegese destas debitada pelo Papa e pelo Vaticano, o cerne do catolicismo) definem os objectivos de Deus para a humanidade.
Hochschild dá agora aulas na Mount St. Mary’s University, uma Universidade católica em Maryland, onde a exegese de Roma é a norma a ser seguida…
De igual forma a Oklahoma Christian University requer que os seus empregados sigam uma declaração de fé que abrange não apenas crenças mas também condutas. Assim, docentes e não docentes devem usar não exactamente burkas mas quase e não podem ter sexo fora do casamento.
Os seus funcionários foram ainda notificados no início do ano que a Universidade pretende alterar a sua política de forma a poder ainda despedir quem se divorcie ou separe sem intenção de reconciliação…
O que têm em comum Tony Blair e George W. Bush? São ambos devotos cristãos renascidos, movidos para a vida política pela sua fé e que afirmam terem sido inspirados e apoiados por Deus na decisão pela invasão ilegal do Iraque.
De facto, já sabíamos que G. W. Bush justificou a guerra no Iraque por obediência a ordens divinas, expressas de viva voz, que lhe incumbiram a guerra ao «eixo do mal»: «Sou conduzido por uma missão de Deus. Deus disse-me ‘George vai e luta contra estes terroristas no Afeganistão’. E eu fui. E então Deus disse-me ‘George, vai e acaba com a tirania no Iraque’. E eu fui.»
Tony Blair foi mais discreto em relação à inspiração divina da sua decisão, por aconselhamento dos seus assessores, que o persuadiram, por exemplo, a não terminar a sua alocução ao país no seguimento da invasão do Iraque, em 20 de Março de 2003, com «Deus vos abençoe». Esses assessores, que Blair classificou de «um bando de ateístas», convenceram-no que não era uma boa ideia invocar Deus porque «estaria falando para muita gente que não quer padres a enfiarem-lhe coisas pela garganta abaixo». Mas afirmou ao então editor do The Times, Peter Stothard, em 2 de Abril de 2003 – o dia em que tropas norte-americanas mataram sete mulheres e crianças num checkpoint – que estava pronto para responder a Deus por «aqueles que morreram ou foram horrivelmente mutilados em consequência das minhas decisões».
Mas hoje no programa da TV1 com Michael Parkinson (partilhado com Andrea Bocelli, Christina Aguilera e Kevin Spacey) Blair confessou que essa decisão, como a maioria das suas decisões políticas, foi inspirada pela sua fé cristã.
Durante o programa, Blair confirmou ainda uma hipótese avançada por um dos seus biógrafos, de que foi levado para a política quando, durante a sua frequência da Universidade de Oxford, redescobriu a religião – cristã, claro, com algumas suspeitas de que Blair se tenha convertido ao catolicismo da sua esposa Cherie, o que talvez explique porque nomeou uma Opus Dei ministra da Educação.
Aparentemente nem os partidos da oposição nem os familiares dos soldados britânicos ficaram impressionados com a manifestação de fé do primeiro-ministro britânico…
Em 1621 morreu o cardeal Bellarmine, o papa Paulo V e o grão-duque da Toscânia, Cosimo II. Galileu havia perdido todos os seus principais apoiantes numa altura em que o poder da Igreja Católica recuperava. Antes de Gregório XV ser eleito papa Galileu publica “O Analisador” e durante o seu papado Galileu fortalece a sua amizade com os Barberini. Francesco Barberini havia sido doutorado em Pisa e o seu tio, o cardeal Maffeo Barberini, escreveu a Galileu elogiando-o. Quando Gregório XV morre Maffeo Barberini é eleito Urbano VIII e a dedicatória à família Barberini agradou ao papa. Isso certamente facilitou a possibilidade de seis audiências em Roma, onde Galileu recebeu algumas homenagens. Urbano VIII dá ainda autorização a Galileu de ensinar o Copernicanismo desde que não o defendesse, o que era ainda melhor que o anterior documento que certificava que Galileu não havia abjurado.
É então que Galileu se prepara para escrever uma das obras mais famosas da História da Ciência: “Diálogo sobre os Dois Principais Sistemas do Mundo”. Nele, Galileu simula um diálogo entre os dois sistemas, copernicano e aristotélico, representados por duas personagens, Salviatti e Simplício, respectivamente. Uma terceira personagem, Sagredo, modera o diálogo de forma neutra mas aos poucos toma o partido de Salviatti. O censor de Roma aprova o livro tal como havia anteriormente aprovado “O Analisador” mas desta vez com uma advertência: Galileu deve incluir no texto uma notificação que adverte o leitor de que ele, Galileu, não apoiava o Copernicanismo. Essa notificação poderia ser alterada na forma mas não na substância. Galileu fê-lo, incluindo-o numa espécie de ex-libris, pela boca de Simplício. Os jesuítas agarraram a oportunidade pelos cabelos e fizeram ver a Urbano VIII que estava a ser insultado. Reuniram-se os eclesiásticos para avaliar a situação.
A acusação de Galileu começou por uma acusação de heresia, por ter publicado um livro (com a autorização de Roma, diga-se) em que ensinava o Copernicanismo. As provas? As minutas não assinadas na comissão com Bellarmine. Galileu foi chamado a Roma.
Para além de conhecer o perigo em que se encontrava, Galileu estava muito doente, com dores crónicas, e tentou adiar a ida a Roma tal como o fizera o seu amigo Sarpi. Tentou ainda impedir a distribuição do livro, tarde demais.
O julgamento iniciou-se em Abril de 1633, sem que a acusação conseguisse arranjar algo mais concreto do que o crime de escrever em italiano e não em latim. Galileu usou o documento que lhe havia sido dado por Bellarmine garantido a inexistência de abjuração. Mas a questão para os inquisidores era simples: uma falsa acusação de heresia era tão grave como uma heresia e a Inquisição não é herege, obviamente. Galileu tinha de confessar algo, nem que para isso fosse torturado. O próprio cardeal Barberini o advertiu desse facto. Galileu percebeu que não tinha saída e assinou a confissão.
«Eu juro que sempre acreditei, acredito agora, e com a ajuda de Deus irei no futuro acreditar em tudo aquilo que a Santa Igreja Católica e Apostólica sustiver, pregar e ensinar […] Eu abjuro de coração sincero e genuína fé, eu amaldiçoo e detesto os ditos erros e heresias, e de forma geral todo e qualquer erro e partido contrário à Santa Igreja Católica. E eu juro que no futuro não direi nem defenderei por palavra ou escrita tais coisas que possam trazer-me semelhante suspeita; e se conhecer algum herege, ou suspeito de heresia, que o denunciarei a este Santo Ofício, ou ao Inquisidor e Ordinário do local onde possa estar.»
Galileu foi condenado a uma prisão perpétua domiciliária por sete dos dez cardeais do tribunal. Um dos três que se recusaram a assinar a pena foi o cardeal Barberini.
Galileu Galilei viria a morrer em 1642 mas não sei antes publicar na clandestinidade a sua obra prima: “Discursos e Demonstrações Matemáticas Relativas a Duas Novas Ciências”. A sua influência na Europa viria a contribuir grandemente para a continuidade do desenvolvimento da Ciência agora estagnado, debaixo do peso da Igreja, na Itália onde o próprio Renascimento havia surgido.
O Diário de uns ateus é o blogue de uma comunidade de ateus e ateias portugueses fundadores da Associação Ateísta Portuguesa. O primeiro domínio foi o ateismo.net, que deu origem ao Diário Ateísta, um dos primeiros blogues portugueses. Hoje, este é um espaço de divulgação de opinião e comentário pessoal daqueles que aqui colaboram. Todos os textos publicados neste espaço são da exclusiva responsabilidade dos autores e não representam necessariamente as posições da Associação Ateísta Portuguesa.