18 de Fevereiro, 2006 Palmira Silva
Pedofilia e a Igreja Católica
Em Novembro último decorreu em Washington uma conferência dos bispos católicos americanos em que o actual presidente, o Bispo William Skylstad, afirmou que o problema da pedofilia no seio da Igreja era algo do passado. Mais concretamente, referindo-se ao escândalo da pedofilia no clero americano e pesadas indemnizações decorrentes, afirmou para os seus pares «não há dúvida, irmãos, que estes últimos anos exerceram um pesado tributo sobre nós» não só relegando para o passado os abusos sexuais de menores perpretados por padres mas sugerindo falaciosamente que a Igreja é uma vítima inocente dos seus próprios crimes. Ignorando as vítimas reais dos abusos realizados, as crianças brutalizadas e, em alguns casos, assassinadas para esconder o abuso, como Daniel O’Connell e James Ellison assassinados pelo padre Ryan Erickson, cujos antecedentes de pedofilia tinham merecido da hierarquia católica … aconselhamento psicológico!
Na realidade o problema mantem-se nos Estados Unidos (e provavelmente noutros locais sem que o público em geral tenha conhecimento) a tal ponto que alguns analistas pretendem que o Congresso atente neste desastre nacional e legisle, a nível federal, de forma a proteger as crianças de mais casos de abuso. Especialmente as limitações temporais, uma vez que uma criança abusada sexualmente e muitas vezes coagida ao silêncio pelo criminoso, precisa amadurecer para entender o que se passou, ganhar coragem e denunciar o abuso. Contrariamente ao que pretende a Igreja Católica nos Estados Unidos que, claro, advoga que não se altere as limitações temporais, uma criança não percebe o que lhe está a acontecer e precisa uns anos para conseguir lidar com o abuso (as que o conseguem), especialmente se este for perpetrado por alguém em quem deposita confiança.
Por outro lado são necessárias leis que punam o encobrimento de casos de abuso sexual, a prática corrente na Igreja Católica. As dioceses continuam a lutar para esconder a real dimensão da pedofilia no seu seio, quiçá tentando passar a opinião do actual Papa que afirmou «Estou convencido que as notícias frequentes sobre padres católicos pecadores [pedófilos] fazem parte de uma campanha planeada para prejudicar a Igreja Católica», mas certamente obedecendo ainda às determinações do actual Papa, debitadas em 2001 ainda como Cardeal Ratzinger, que ordenou ficarem em segredo pontifício todos os casos de abuso sexual de menores por parte de sacerdotes católicos, ou seja, ameaçou de excomunhão todos os eclesiásticos que revelassem às autoridades civis quaisquer detalhes sobre casos de pedofilia.
De facto, mais escândalos de pedofilia no seio da Igreja Católica vieram a lume recentemente, um dos quais particularmente grave, em Chicago, onde Cardeal Francis George se declara «muito triste» pela forma como tratou o caso do padre Daniel McCormack e promete (mais uma vez) alterar a forma como a arquidiocese tratará as acusações de pedofilia no futuro.
Considerando que uma freira (que pediu, pelas razões óbvias, o anonimato) denunciou em 2000 aos seus superiores hierárquicos o peculiar comportamento de McCormack e que no ano passado uma mãe o denunciou à polícia e que a resposta da arquidiocese foi, para além de lhe arranjar um colega de residência que garantisse que McCormack não ficasse sózinho com alguma criança, promovê-lo a reitor de uma série de paróquias em torno de North Lawndale a promessa do Cardeal parece um pouco oca…
De igual forma o padre Neil Doherty da arquidiocese de Miami foi preso por violar uma criança com menos de 12 anos. Os advogados da Igreja, comprovando os protestos de tolerância zero, argumentam que a criança foi abusada por… sua própria culpa, ou antes, o termo usado foi negligência, manifestada quando tinha 10 anos! Outro abusado pelo padre foi acusado de «encobrimento fraudulento» por… não se ter queixado antes!
Neste caso desde os finais dos anos 70 que há queixas do padre, cujo modus operandus aparentemente incluia drogar primeiro as crianças e depois violá-las e inclusive em 1994 a arquidiocese foi forçada a pagar 50 000 dólares num acordo para impedir que outra acusação de abuso sexual de Doherty chegasse a tribunal (e aos jornais). A arquidiocese recebeu igualmente em 1992 uma carta dos pais de um estudante violado por este padre…
Também em Joliet, nas imediações de Chicago, o bispo local, num testemunho em tribunal vindo a público recentemente, para grande consternação da Igreja católica, que tentou que estas declarações não se tornassem públicas, confirmou que, embora sabendo que vários padres sob as suas ordens eram abusadores sexuais, não só encobriu os casos como apenas transferia os padres abusadores. Completamente o oposto que declarou em 2002…
Assim, não só a prática corrente da Igreja Católica continua a ser o encobrimento de casos de abuso sexual perpetrado por eclesiásticos, muitas vezes «recompensados» com promoções após serem de tal denunciados pelas vítimas, como aqueles que denunciam e tentam ajudar as vítimas de pedofilia são… suspensos, como aconteceu a Bob Hoatson, um padre de New Jersey, que num testemunho em Maio último afirmou que os responsáveis da Igreja católica têm mentido sobre casos de pedofilia!