Uma religião de paz?
No que as autoridades paquistanesas pensam ser um ataque perpetrado por um bombista suicida morreram pelo menos 8 crentes shiitas (números não oficiais) que celebravam o festival de Ashura na cidade Hangu no norte do Paquistão. De acordo com algumas testemunhas, a multidão que recordava a morte do neto de Maomé, o imam Hussein, na batalha de Karbala (o evento que vincou a separação entre shiitas e sunitas) foi ainda alvo de atiradores desconhecidos.
De igual forma no Iraque as autoridades seguem medidas estritas de segurança para evitar ataques de sunitas aos shiitas que celebram a Ashura. O ano passado e há dois anos morreram, respectivamente, 55 e 170 shiitas numa série de ataques coordenados. Cerca de 10 000 agentes de segurança concentram-se em Karbala, o local onde Hussein foi morto pelos seguidores de Abu Bakr, o sogro de Maomé via a sua jovem (Maomé casou com esta quando ela tinha 6 anos e o profeta 54) mulher Aisha.
Em relação à «guerra dos cartoons», gostaria de recordar que os shiitas não têm a objecção dos sunitas em relação à retratação da figura humana, sendo abundantes as representações quer de Hussein quer do seu pai Ali, o marido da filha de Maomé, Fátima.
Assim não se percebe muito bem a reacção violenta do Irão em relação às caricaturas ou talvez se perceba se considerarmos que ontem em Teerão a embaixada inglesa foi atacada sob o pretexto das caricaturas, que não foram reproduzidas na imprensa britânica, na realidade pela oposição de Londres ao armamento nuclear por parte do Irão. Como dizia um dos manifestantes iranianos ontem «Estamos aqui para protestar o papel de Inglaterra em nos mandar para o Conselho de Segurança das Nações Unidas. Nós temos de defender o nosso direito a tecnologia nuclear».
Entretanto em Kano, um dos estados da Nigéria que adoptou a Sharia em 2000 e onde se verifica um programa agressivo para forçar a lei islâmica (wahhabita) em todos os habitantes, a maioria dos quais é Sufi Qadiriyyai, as bandeiras dinamarquesa e norueguesa foram queimadas com pompa e circunstância no Parlamento local.
O «moderado» sheikh Yousef Al-Qaradhawi, presidente do Conselho Europeu para a Fatwa e Investigação, presidente ainda da Associação Internacional de Estudos Islâmicos (IAMS), e o guia espiritual de muitas organizações islâmicas (incluindo a Irmandade do Islão) exortou os fiéis a demonstrarem ao mundo a sua raiva pela publicação dos cartoons de Maomé. O sermão foi transmitido pela televisão do Qatar em 3 de Fevereiro, um pouco antes dos ataques às embaixadas dinamarquesa e norueguesa em vários locais do mundo islâmico… (excertos do sermão aqui).
O «moderado» sheikh exige ainda que a ONU passe uma resolução que proteja de qualquer crítica ou menção não só os profetas e lugares sagrados do Islão mas também os «mensageiros de Alá». Dado a profusão de sectos (e as guerras sangrentas entre estes) dentro do Islão, pergunto-me quem decide quem devem ser considerados mensageiros de Alá… Serão todos os que assim se auto-proclamam? Como não assisti a manifestações comparáveis de repúdio por parte dos muçulmanos à associação de violência ao Islão, bem pelo contrário, pelos ataques terroristas perpetrados em «nome de Alá» será que Osama bin Laden e afins devem ser assim considerados? Significa isso que este muçulmano «moderado» pretende dar carta branca a todos os fanáticos em nome de Alá?