Propaganda eleitoral
Como já há uns largos meses previ, o Vaticano veio em auxílio, (mal) disfarçado, claro, de outro católico exemplar, grande defensor de óvulos e espermatozóides, Silvio Berlusconi, que parte para as eleições de Abril próximo com uma clara desvantagem em relação ao seu opositor, que encabeça a coligação de centro-esquerda, Romano Prodi.
Não obstante dizer que a Igreja Católica não vai interferir nas eleições apoiando directamente, isto é, pelo nome, qualquer dos candidatos, o Cardeal Camillo Ruini, o eclesiástico máximo da Conferência de Bispos Italianos, afirmou que os eleitores italianos «deviam ter em consideração» assuntos como o aborto e o reconhecimento legal de uniões de facto homossexuais, vivamente condenados pelo Papa há uns dias, quando escolherem quem os vai governar nos próximos anos.
Considerando que Romano Prodi, social-democrata que foi presidente da Comissão Europeia, se declarou a favor do reconhecimento dos direitos legais dos casais que vivem em união de facto, hetero ou homossexuais, embora não pretenda permitir o casamento homossexual e que Berlusconi se tem desdobrado em aparições públicas com um discurso que mereceu a observação no Corriere della Sera que, aos 69 anos e casado em segundas núpcias, Berlusconi «aparentemente tornou-se um cristão tradicionalista do dia para a noite», não é muito difícil ver nas palavras do Cardeal um apelo ao voto em Berlusconi!
De facto, usando toda a máquina mediática que controla, Silvio Berlusconi tem reiterado ao vivo e a cores, sob o aplauso do Vaticano, que a sua coligação de centro-direita representa os «valores familiares» e como tal afirmou já o seu repúdio ao reconhecimento das uniões de facto. Para além disso, pretende limitar as importações da pílula Mifepristone, mais conhecida como RU486, num país em que o aborto é legal desde 1978, e prometeu colocar activistas pró-vida nos centros estatais de aconselhamento sobre o aborto. O discurso pré-eleitoral fundamentalista católico de Berlusconi já levou milhares de manifestantes a Roma e Milão reclamando, respectivamente, o reconhecimento legal de todas as uniões de facto e que não seja revogada a lei de 1978, referendada em 1981, que permite o aborto em Itália.
Entretanto as tentativas de conquistar o voto católico de Berlusconi atingiram contornos caricatos no fim de semana passado quando, em directo numa das quasi diárias aparições nas estações de televisão italianas, prometeu honrar o «ideal católico da castidade» abstendo-se de sexo até depois das eleições!
O Corriere della Sera realça no entanto que o voto de castidade temporária de Berlusconi surgiu depois de ele ter respondido «Sim, frequentemente» à pergunta do tele-pregador que o entrevistava se tinha sido fiel às suas mulheres…