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Neo-Criacionismo 0 – Ciência 1


80 anos depois: Fundamentalistas cristãos continuam a exigir que o evolucionismo seja apresentado apenas como uma teoria (no sentido não científico de palpite) não como o facto científico que na realidade é.

Na passada quinta-feira foi conhecida a decisão do juíz John Jones, um nomeado por Bush e como tal dificilmente acusável de ser um militante (esquerdista) ateu, em relação ao caso conhecido como o julgamento de Kitzmiller, o outro julgamento que agitou as guerras da evolução nos Estados Unidos. Numa decisão crucial, especialmente se considerarmos o sistema judicial americano em que decisões anteriores sobre um dado tema são utilizadas na determinação de sentenças posteriores, o juiz federal decidiu que o ensino do desenho (pouco) inteligente é inconstitucional já que viola a separação da Igreja e do Estado preconizada na Constituição americana. A decisão do juíz constitui assim uma vitória por knock-out da ciência contra os obscurantismos cristãos disfarçados de IDiotia, uma vez que não só foi banido definitivamente o ensino da IDiotia nas aulas de ciência de Dover como foi criado um precedente que permitirá que a normalidade e verdade científica sejam repostas a breve trecho em todo o país!

Que a IDiotia não passa de um subterfúgio para proselitar os estudantes é explicado pelo juíz na sua opinião de 139 páginas (pdf disponível), muito bem fundamentada e que não deixa margem de manobra ou apelo aos IDiotas, «Nós concluímos que não é [ciência] e para além disso que o ID não se consegue separar dos seus antecedentes criacionistas e como tal religiosos».

Podemos ler ainda a opinião do juíz sobre os membros do Conselho de educação que segundo ele disfarçaram os seus verdadeiros motivos (religiosos) para introduzir a IDiotia nos curricula de ciências do distrito de Dover, decisão classificada de «inanidade de tirar a respiração»: «Nós concluímos que os motivos seculares utilizados pelo Conselho não são mais que um pretexto para o verdadeiro objectivo do Conselho, que era a promoção da religião nas salas de aulas públicas».

Em relação ao velho* (e errado) argumento de que o evolucionismo é uma teoria e não um facto usado pelo Conselho de Educação na sua declaração de Outubro de 2004 que justificava o ensino da Idiotia como uma «teoria» alternativa, o juiz, evidenciando que de facto ouviu os muitos cientistas que testemunharam no julgamento e percebeu os motivos religiosos de pseudo-cientistas como, por exemplo, Michael Behe, que admitiu que a plausibilidade da IDiotia depende de se acreditar em Deus, declarou que:

«Na realidade a teoria da evolução de Darwin é imperfeita. No entanto, o facto de que uma teoria científica não consegue ainda explicar todos os pontos não deveria ser usado como pretexto para impingir nas salas de aulas de ciências uma hipótese alternativa não falseável e baseada em religião ou para denegrir propostas científicas bem estabelecidas».

As guerras da evolução nos Estados Unidos, felizmente com o final feliz que esta decisão indicia, deveriam alertar os mais complacentes para o facto que qualquer religião quando suportada pelo poder político mostra a sua verdadeira face integrista, prepotente e intolerante, tentando obrigar que as suas concepções anacrónicas e anti-científicas sejam «vendidas» a todos, via instituições públicas, como sendo «verdades absolutas».

Recordo que as guerras da evolução ameaçam extravasar para o Velho Continente, especialmente depois de Bento XVI ter afirmado que o Universo e o homem foram criados por um «projecto inteligente» e que tal só não é conhecimento comum porque algumas pessoas «enganadas pelo ateísmo que têm dentro de si, imaginam um Universo livre de propósito e ordem, como se estivesse à mercê do acaso». Perguntando falaciosamente «Quantas dessas pessoas existem hoje em dia?» e concluindo que «Essas pessoas, enganadas pelo ateísmo, acreditam e tentam demonstrar que é científico pensar que tudo é livre de propósito e ordem».

Claro que os nossos fiéis leitores crentes, que tanto se indignam com as nossas críticas das inanidades debitadas como verdades absolutas pela santa madre Igreja, não se apercebem da intolerância em relação aos ateístas que estas (e outras que abordarei brevemente) declarações da hierarquia da Igreja evidenciam. Claro que não esperaria que a Igreja demonstrasse qualquer respeito em relação à nossa forma de pensar. Contrariamente aos nossos leitores que reinvidicam que respeitemos a sua forma de pensar e nos mimam com epítetos de intolerantes, não advogo que tal aconteça já que tolerância é simplesmente «a atitude de admitir a outrem uma maneira de pensar ou agir diferente da adoptada por si mesmo». As religiões são de facto intolerantes porque não admitem nem ideias nem formas de agir diferentes das que preconizam. Basta pensar no que se passa na vizinha Espanha em relação ao casamento de homossexuais e nas guerras da interrupção voluntária da gravidez que se avizinham cá no burgo para confirmar que o catolicismo não é excepção!

*A primeira versão do «teoria não facto» foi adoptada pelo Conselho de Educação da Califórnia em 1924-1925 em resposta aos estridentes protestos dos fundamentalistas cristãos em relação ao ensino da evolução neste estado. Em 1925 o Conselho aplicou esta decisão em relação a livros de texto rejeitando aqueles que se atreviam a tratar a evolução como algo mais que uma «teoria» coloquial.

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