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Mês: Julho 2005

5 de Julho, 2005 Mariana de Oliveira

A derrota

O jornal do Vaticano L’Osservatore Romano, na sua edição de domingo, qualificou a legalização dos casamentos homossexuais em Espanha como «uma derrota da humanidade».

O jornal esclarece que a oposição da Igreja Católica a esta iniciativa não é uma «guerra de religião», uma vez que a família não é algo imposto pela Igreja, «mas um património das grandes culturas». Claro que se os conceitos de família forem diferentes, aquele que não é conforme com a concepção da ICAR, é obra de uns quantos senhores que pretendem acabar com a sociedade como a conhecemos.
«Causa incredulidade e amargura o tom triunfalista com os que alguns políticos e intelectuais “progressistas” comentaram a lei que legaliza as uniões homossexuais, equiparando-as ao matrimónio heterossexual», diz o artigo.

«Não só os crentes, mas qualquer pessoa com senso comum, livre do preconceito, não pode deixar de reconhecer neste acto uma derrota da humanidade», diz o L’Osservatore Romano. Suponho que este preconceito seja aquele que permite a determinadas pessoas ver os homossexuais como pessoas iguais às outras em direitos e obrigações.

«É singular que um Estado que se proclame “laico” e “liberal” pretenda impor o próprio sistema ideológico sobre uma realidade tão complexa», diz o jornal do Vaticano. «É enganador apelar à “tolerância” ou à “não discriminação” para renegar e tocar a elementar verdade sobre as relações humanas. Não há que abdicar nunca da verdade. Se as palavras têm sentido, há que continuar a as coisas por seu nome». Primeiro de tudo, é por o Estado ser laico e liberal que a natureza contratual do casamento foi afirmada e se desprendeu de concepções morais que nada servem a um Direito democrático.
Segundo, é indiscutível que a realidade seja complexa e este é o motivo pelo qual o Direito não é estático e tem de se adaptar às exigências da sociedade e tutelar situações juridicamente relevantes, como o são os contratos de casamento entre duas pessoas.
Terceiro, o artigo fala em verdade. Ora, por muito que seja essa a vontade da ICAR, não existe uma Verdade que se sobreponha às outras. O que existe são diferentes concepções do mundo que, aos olhos de uns, são mais válidas do que outras. Nada mais.

Concluir que a legalização dos casamentos homossexuais representa «uma derrota da humanidade» é de uma brutalidade atroz sem fundamento e que só revela o que já sabemos: que a ICAR é incapaz de ver uma sociedade plural, com diferentes valores e concepções de vida.

4 de Julho, 2005 Palmira Silva

O fanatismo invadiu os Estados Unidos?


Depois de o uso de calças de corte baixo, que deixam à vista ofensivos e estratégicos detalhes da anatomia humana, ter sido «criminalizado» nos estados da Virgínia e Louisiana chegou a vez da Flórida! Por enquanto restrita a Jacksonville onde uma igreja local pretende uma lei semelhante a ser aplicada na cidade! Proibindo, para além das ofensivas calças, a exibição de… dentes de ouro!

Quiçá importarão a lei 1626 da Louisiana cuja proposta reza:

A. It shall be unlawful for any person to appear in public wearing his pants below his waist and thereby exposing his skin or intimate clothing. (Será ilegal que qualquer pessoa apareça em público usando calças abaixo da cintura e assim expondo a sua pele ou roupas íntimas)
B. Whoever violates the provisions of this Section shall be fined not more than five hundred dollars or imprisoned for not more than six months, or both. (Quem violar as provisões desta secção será multado em não mais de 500 dólares ou preso por um período não superior a seis meses, ou ambos).

4 de Julho, 2005 jvasco

4 de Julho

Em 4 de Julho celebra-se o dia da independência dos EUA.
Da sua declaração de independência, nasceu uma nova nação, uma das primeiras, no mundo, em que a liberdade religiosa estava consagrada na constituição, em que havia uma separação significativa entre o estado e o clero.
Os autores desta declaração, os pais fundadores dos EUA, tiveram uma postura ousada e admirável a respeito da questão religiosa.

Independentemente do facto do governo americano estar a enterrar, a passos largos, a herança de liberdade religiosa conquistada, eu não deixo de felicitar este dia 4 de Julho.

3 de Julho, 2005 Carlos Esperança

Viva a França

A França assinla hoje o primeiro centenário da lei da separação da Igreja e do Estado, votada há cem anos pela Câmara dos deputados, e cujas comemorações terão lugar no último trimestre deste ano.

A lei mantém-se e está na base da liberdade religiosa que a França assegura a todos os cidadãos quer professem ou não uma religião.

Quando da aprovação da referida lei as relações entre o Vaticano e a França foram cortadas e houve uma forte contestação pelos sectores mais retrógrados da Igreja católica e uma permanente conspiração do Vaticano contra a laicidade de que a França foi pioneira.

Hoje são os próprios bispos franceses a reconhecerem que a lei se deve manter e, apenas, procuram habilmente obter alguns privilégios para a Igreja católica de que, no fundo, são incapazes de abdicar.

A França foi neste capítulo verdadeiramente inovadora e criou as bases para um sistema democrático que só é possível com a separação entre a Igreja e o Estado.

Hoje é o paradigma das democracias e a vacina para evitar as guerras religiosas que ao longo dos séculos dilaceraram a Europa.

Perante os tristes exemplos no Islão político, a mais patética manifestação de fascismo religioso com total ausência de direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, sujeitos ao poder discricionário dos clérigos e à vontade de um livro anacrónico – o Corão -, há boas razões para estarmos gratos aos deputados franceses de 1905.

Viva a França.

3 de Julho, 2005 Carlos Esperança

Milagres encomendados no México

«A Conferência Episcopal Mexicana está a trabalhar afincadamente na recolha de todas as informações e eventuais milagres que possam ajudar ao rápido avanço da causa de beatificação e canonização de João Paulo II, inaugurada oficialmente no passado dia 28 de Junho. O Papa polaco visitou este país por seis vezes e tinha com os mexicanos uma relação de profunda empatia» – informa a Agência Ecclesia.

Algumas observações:

1 – É um desperdício arranjar mais milagres para canonizar o cadáver. Vão sobrar milagres para a beatificação e canonização, há muito decididas;

2 – A alegada empatia de JP2 pelos mexicanos é a forma de ser de um vendedor perante um bom cliente;

3 – As seis viagens devem-se ao facto de JP2 gostar de viajar e ver no México um bom mercado para a religião de que foi durante muitos anos Director de Marketing e Director Geral;

4 – Os bispos mexicanos aproveitam a oportunidade para mobilizar os crentes e continuarem a exercer a influência política, económica e social de que gozam no México.

5 – As Igrejas, em geral, e a católica, em particular, comportam-se como as outras empresas na luta pela quota de mercado e pelo aumento das vendas.

1 de Julho, 2005 jvasco

Jesus era socialista

«Quem tem duas túnicas reparta com quem não tem nenhuma, e mesmo quem tem mantimentos faça o mesmo» Lc 3:11

Já é recorrente e cansativa a acusação que alguns comentadores fazem de que o DA «é de esquerda». Não importa que se escreva que o ateísmo e o DA não têm côr política, que temos autores de diferentes ideologias, que nos encontramos da defesa do laicismo mas não na defesa deste ou daquele ideal – tudo isso é indiferente. Porque há pessoas que acham mais fácil ignorar argumentos e razões dos ateus se os etiquetarem como defendendo determinadas ideias/partidos/interesses, sem precisarem de expôr suas probres cabecinhas a novas ideias e relações. Não importa que seja errado: é fácil.

Eu acho a acusação particularmente irónica, precisamente porque vejo na figura e nas ideias de Jesus a maior defesa do ideal socialista! A doutrina que a Bíblia defende para a organização económica da sociedade é o socialismo! Sim: o Novo Testamento defende o ideal socialista da mesma forma que o «manifesto comunista».

Pessoalmente, eu rejeito o socialismo – acho uma forma pouco adequada e eficiente de distribuir os recursos pela sociedade (não vou explicar porquê, visto não estarmos num blogue de política) – mas eu posso fazê-lo à vontade, porque sou ateu. Se eu fosse cristão (e já fui), não poderia rejeitar o socialismo: por muito ineficiente que o sistema me parecessse, eu não iria pôr em questão a «vontade de Deus».

Assim sendo, cada vez que escrevo mostrando que Deus é produto da nossa imaginação e que Jesus (aquele que afirmou que que «é mais fácil passar um camelo na ponta de uma agulha que um rico entrar no reino dos céus» ou que «ai de vós ricos que destes a vida em vosso consolo pois vos digo que haveis de chorar» e outras que tais…) não é filho de Deus nem tem nada de divino, estou na verdade a defender a hipótese de que o socialismo não é necessariamente (como creio não ser) a solução para a sociedade.

E não me venham com a conversa de que a Igreja é inimiga dos comunistas, que sempre esteve contra os marxistas, e argumentos do tipo, como se isso fizesse apagar a enorme quantidade de passagens bíblicas que exortam ao socialismo. A Igreja já vendeu indulgências, já encorajou cruzadas, já instituiu a inquisição, já condenou a tradução da Bíblia – a Igreja por diversas vezes ao longo da história colocou os seus interesses geo-políticos à frente daquilo que notoriamente seria a mensagem de Cristo. Quem defende que Cristo nunca aprovaria as cruzadas, não pode defender que a doutrina económica que a Igreja defende ou deixa de defender é mais válida do que aquela que notoriamente é defendida no novo testamento.