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Mês: Março 2005

11 de Março, 2005 Carlos Esperança

Recordar Madrid

Há 1 ano, a esquizofrenia da fé transformou três estações ferroviárias de Madrid num imenso espaço de terror e crueldade. 192 mortos e cerca de 1400 feridos foram vítimas da demência religiosa ao serviço de um carrasco de nome Maomé.

Há 1 ano, a Espanha foi vítima de uma matança com motivações religiosas. O sangue de trabalhadores, estudantes e outros passageiros de comboios matutinos jorrou em abundância. O terrorismo imolou pacíficos cidadãos em nome de uma fé anacrónica testemunhada por facínoras de uma civilização falhada.

Enquanto mesquitas, igrejas e sinagogas forem locais de pregação do ódio, não são apenas sítios onde se alienam crentes piedosos, são campos terroristas onde se recrutam e incentivam soldados de Deus para assassinar infiéis.

Nenhum Deus merece o sacrifício de um único ser humano e ninguém pode justificar o banditismo em nome da fé.

O crime que dilacerou Madrid e emocionou o mundo civilizado, teve a marca da Al-Qaeda, espécie de Opus Alá cujo proselitismo pretende sujeitar a humanidade a cinco orações diárias e à insânia do Corão.

Não é uma guerra de civilizações que está em causa, é a luta permanente entre a fé e a razão, o ódio da religião à democracia, o antagonismo entre Deus e a liberdade.

No dia 11 de Março de 2004 a religião islâmica escreveu em Madrid mais uma página de horror com o sangue de inocentes. Foi mais um episódio cruel da religião contra a democracia, uma tentativa desesperada de retardar a marcha da humanidade para sociedades mais justas, fraternas e progressistas.

A violência faz parte do código genético das religiões. Do Islão e das outras.

11 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

Comemorações

Hoje é o dia da disciplina de Educação Moral e Religiosa Católica e, este ano, é celebrado em todas as escolas desde o 1º ciclo do ensino básico ao secundário.

Numa mensagem enviada aos professores da disciplina, Augusto Cabral, director do Secretariado Nacional da Educação Cristã, referiu que os subsídios distribuídos por aquela organização – ligada à Comissão Episcopal da Educação Cristã, da Conferência Episcopal Portuguesa – aos professores de Educação Moral e Religiosa Católica «são simplesmente uma oportunidade de reflexão e de acção para ir ao encontro das várias dimensões do ser humano e para proporcionar estratégias pedagógicas comuns». Dimensões e estratégias comuns apenas aos católicos que, numa clara subversão de um ensino laico, privilegia uma religião em detrimento de outras ou de nenhuma. É de notar que esse subsídio oferecido pelo Secretariado Nacional da Educação Cristã vem a adicionar-se aos fundos dispendidos pelo Estado Português, provenientes dos nossos impostos, para financiar aquela disciplina religiosa.

Na referida mensagem, Augusto Cabral, afirma que a Educação Moral e Religiosa Católica quer «orientar na reflexão sobre o sentido da vida, promovendo o discernimento para uma lúcida compreensão dos acontecimentos, contribuindo para uma assimilação dos valores e para a aquisição de referências que permitam definir um Rumo para a existência pessoal». Muito bem, os católicos estão no seu direito de quererem «orientar na reflexão sobre o sentido da vida» dos seus fiéis graças à liberdade de culto e de consciência, mas esse direito não deve ser exercido num espaço de ensino público que é destinado a todos os alunos e que se quer neutral.

A existência de uma tal disciplina nos currículos dos alunos é, só por si, algo que arrepia a laicidade do ensino público, mas a comemoração da sua existência tem um pendor proselitista e arrogante inadmissível.

10 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

Infame decreto

O decreto 7/2005, de 1 de Março, da Presidência do Conselho de Ministros representa um dos mais flagrantes atropelos à Constituição da República Portuguesa. Este documento decreta o luto nacional pela morte da senhora Lúcia.

A Lei Fundamental, no seu art. 13º, estabelece um princípio da igualdade, ou seja, «todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei» (número 1)e «ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social» (número dois). Mais à frente, no art. 41º, estipula-se o seguinte: «a liberdade de consciência, de religião e de culto é inviolável».

Ora bem, o mencionado decreto afirma que «a Irmã Lúcia foi um dos testemunhos vivos de um acontecimento decisivo na História do Portugal contemporâneo – a sequência das aparições de Fátima -, tendo consagrado toda a sua existência a um culto e a uma reflexão que não deixaram indiferentes largas camadas da população portuguesa, incluindo os não-crentes». É inegável que a existência daquela senhora marcaram os não-crentes, especialmente com mensagens tão democráticas como aquela em que diz que Salazar foi um enviado de Deus.

Mas o pior deste texto é o facto de o Governo da República Portuguesa considerar como verdadeiras as aparições de Fátima, fenómeno contestado mesmo no seio da própria Igreja Católica, com o decreto a insistir: «de facto, as aparições de Fátima, de que a Irmã Lúcia foi directa interveniente (…)».

É inadmissível que, trinta anos após o fim do fascismo, tenhamos tido um executivo que vergasse a República de uma forma tão indecente à religião. É nestas alturas que desejo ter nascido por alturas da Primeira República.

10 de Março, 2005 André Esteves

Fait Divers dos Últimos Dias

Esquizofrénico mata filho de 4 anos por ser o anti-cristo

«Ele tinha o número da besta, 666, tatuado na testa.» – foi uma das desculpas que Ivan Henk apresentou, por ter raptado e morto o seu filho de 4 anos. Foi condenado a prisão perpétua.
O Fait-Divers

Casamento hindu de 4 crianças com cães para afastar o «mal»

Em Kuluptang na província de Jharkhand na Índia foi realizado um kukur vibaha.
Trata-se de um casamento ritual com cães, de maneira que estes carreguem o mau karma que as crianças possam ter. Neste caso, um dos dentes de leite de uma das crianças nasceu antes dos outros.

(Coitados dos cães, já não basta o resto. Agora, carregar com o mau karma dos humanos. De qualquer maneira, não me parece ser um bom começo para um casamento…)
O Fait-Divers

Iraniana pede divórcio. Causa: marido não toma banho há anos…

O marido até era limpo. Demasiado limpo. Tomava três banhos por dia e limpava as mãos compulsivamente. Mas houve um dia em que deu um clique. Deixou de tomar banho.
Agora, a mulher quer se divorciar e até os filhos a apoiam tal deve ser o cheiro.
Vamos ver se a sharia apoia este pedido de negligência odorífica.

(Na realidade, a queixa da senhora é uma maneira subtil de indicar ao tribunal que o seu marido anda a desleixar-se nas questões religiosas. Os muçulmanos são obrigados a várias abluções rituais ao longo do dia e antes de entrarem numa mesquita.)
O Fait-Divers

Criança suspensa da escola por mãe se recusar a discipliná-la com pancada

Numa escola fundamentalista cristã americana, uma criança foi suspensa porque a mãe se recusou a discipliná-la fisicamente, depois de a isso ser intimada pelo director da escola.

Provérbios 23:13,14
13 Não retires da criança a disciplina; porque, fustigando-a tu com a vara, nem por isso morrerá.
14 Tu a fustigarás com a vara e livrarás a sua alma do Inferno.

O autor recomenda a experiência de serem espancados com fios eléctricos ao som de versículos bíblicos. É formador do carácter enquanto crianças e adolescentes. Produz ateus àcidos e sarcásticos como o autor.
O Fait-Divers

Concurso dinamarquês entre padeiros, para a criação de uma hóstia com novo sabor

Cansados do mesmo sabor de sempre das hóstias, as paróquias luteranas da ilha dinamarquesa de Funen resolveram abrir uma competição aos noventa padeiros da ilha, para arranjar um novo sabor e uma nova receita de hóstias.

Sugeria o sabor a galinha. Segundo o que para aí dizem é o que mais se aproxima…
O Fait-Divers

Um em cada dois russos acham que Estaline foi um líder sábio

Palavras para quê…
Quatro em cinco católicos também acham que qualquer papa é democrático…
O Fait-Divers

10 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

Aquele dia

Comemorou-se, no passado dia oito, o Dia Internacional da Mulher. Noventa e cinco anos depois de ter sido proposto, por Clara Zetkin, na 2ª Conferência Internacional de Mulheres Socialistas, continuamos a ter uma data que nos lembra que ainda não atingimos a paridade.

As religiões têm muita responsabilidade nesta discriminação. E não precisamos de ir para um país islâmico ou do chamado terceiro mundo para ver como as mulheres são tratadas. Há uma semana passada, neste nosso país civilizado, vimos um padre a disparar contra quem usa métodos contraceptivos; às portas de Lisboa pratica-se a excisão do clitóris; o aborto continua a ser crime e toda uma estranha moralidade defende o modelo tradicional da família em que a mulher tem de cuidar é dos filhos e do marido.

O ideal seria não ter um dia para comemorar a mulher.

9 de Março, 2005 Carlos Esperança

Conventos e liberdade

Todas as religiões têm casas de reclusão, a pretexto da piedade e da oração, onde encarceram os débeis de vontade, os fanáticos do divino ou os mais depressivos dos devotos. Às vezes são apenas vítimas de famílias que lhes querem confiscar a herança, de coacção ou de chantagem. Têm, em regra, uma hierarquia rígida, uma disciplina despótica e um tratamento desumano. Bem sabemos que é para maior glória de Deus e para gozo da Santa Madre Igreja.

Os conventos estão atribuídos a Ordens, consoante as patologias. Uns dedicam-se à contemplação, outros ao silêncio, vários à auto-flagelação, quase sempre em acumulação de diversas taras que, no caso da ICAR, são autorizadas pelo Papa e conduzem em regra o/a fundador/a à canonização.

Admitamos que as vítimas se aprisionam de livre vontade, que o desejo do Paraíso as inclina para o masoquismo, que a ociosidade as anula, que a inteligência, a vontade e os sentimentos se consomem na estéril clausura e na violência dos votos. Aceitemos que há seres racionais que acreditam que, algures, um Deus aprecia a alienação, o sofrimento e a violência. Imaginemos um Deus que se baba de gozo com os ambientes concentracionários despoticamente defendidos por madres ou frades ungidos do direito à tirania.

A título de exemplo lembro a Ordem das Carmelitas onde, só a título muito excepcional, é permitido falar. E essa generosa autorização tem fortes grades a proteger qualquer encontro. É em ambientes prisionais assim, despojados de nome, de pertences e de memória, que exércitos de inúteis fardados de forma bizarra se encontram ao serviço do Papa. Na Irlanda, há poucos anos, o Governo foi obrigado a averiguar o que se passava no campo de concentração «As irmãs de Maria Madalena», tendo fechado a espelunca e libertado as vítimas, condenadas a prisão perpétua pela própria família, por terem sido mães solteiras ou, apenas, demasiado bonitas e serem perigosas na sedução dos homens.

Será possível que os Governos democráticos, a quem cabe a defesa da Constituição, o dever de respeitar e fazer respeitar os direitos e liberdades dos cidadãos, se conformem com a renúncia de alguns à cidadania e, nem ao menos, averigúem se é de livre vontade que bandos de frades e freiras façam de lúgubres e sinistros conventos o mausoléu da vida?

8 de Março, 2005 André Esteves

O Kitsch da Fé

Os Estados Unidos da América têm uma longa tradição de obras monumentais: o monte Rushmore com as caras dos presidentes, o «falo» de Washington, etc. Faz-se tudo em grande. No entanto, houve sempre um não-sei-quê de original e/ou neo-clássico nessas obras.

Esta é a primeira que encontro que mais se aproxima do espírito das grandes obras soviéticas do período estalinista. E claro!!! Conduzida pelo mais profundo e básico capitalismo. Do dízimo dos crentes directamente para o ego do seu pastor…

E assim na profunda e grande América, que é grande em tudo, menos no sentido de estética e de proporções: O Cristo levanta as mãos ao céu, implorando ao pai, perdão, pelo mau gosto evidenciado pelos seus seguidores…

– Pai!! Perdoa-os!! Eles não sabem o que fazem…

Longe vão os tempos do 2ºmandamento, tão próximo do coração na Reforma:

Exodo 20:4
4.Não farás para ti imagem esculpida, nem figura alguma do que há em cima no céu, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra.
5 Não te encurvarás diante delas, nem as servirás; porque eu, o Senhor teu Deus, sou Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me odeiam.
6 e uso de misericórdia com milhares dos que me amam e guardam os meus mandamentos

Claro que se a ICAR o tivesse seguido desde o início não haveria reforma e o kitsch de Fátima não existiria. E isso seria uma perda terrível para o mau gosto da humanidade…

8 de Março, 2005 Carlos Esperança

ORAÇÕES PLUVIAIS…

1 – Reza-se para pedir a deus que modifique o estado de secura que provocou, deixando agora cair chuva…
… Mas sendo deus perfeito, por definição conceptual divina, não podia ter criado uma imperfeição – a seca danosa.
Então, se criou uma imperfeição, não é deus. Do qual, concomitantemente, não há nada a impetrar…
Se a seca não for uma “imperfeição” para deus, então, também não há nada a reclamar da entidade divina…

2 – Deus é imutável, por definição conceptual, pois que não faz sentido que esse agente universal ande a percorrer o mundo à procura de informações e coisas, nem se conceba que se transmute para alcançar o que quer que seja.
Portanto, deus foi, é e será, esteve, está e estará, sem se poder acrescentar mais nada. Imutável.
Mas, então, os cristãos, com destaque óbvio para os católicos, não podem rezar, impetrando a benesse divina, pois que isso seria admitir, ipso facto, que o seu deus teria que mudar a sua atitude, fautora de seca, para uma outra, fautora de chuva, o que contraria o conceito dum deus intrínseca, inextricável e conceptualmente imutável.
A reza do piedoso povo cristão implica a admissão que deus é mutável, de fautor de seca para fautor de chuva, o que contraria, antiteticamente, a sua imutabilidade conceptual; se pegarmos, primeiro, pelo conceito, então, deus é imutável, logo não há chuva a reclamar, pois que teria que modificar, adrede, as condições naturais…

3 – Claro que o bom povo cristão, armado em arguto, mas, no fundo, imbuído de necedade larvar, costuma contornar, cavilosamente, a “relação” deus-humanidade, alegando que aquele pseudocandidato a coisa criou-nos, mas deixou-nos em livre curso, redundando a responsabilidade, apenas, cá para a gente…
Ora, se o povo utiliza expressões tais como: “Se deus quiser”, “Deus queira”, “Graças a deus”, não se pode, por concomitância, alegar que tal figurão celestial nos deixou em livre curso, pois que se está a admitir a intervenção divina…
Sendo assim, também não há chuva a impetrar, pois que tudo é «graças a deus» e «se deus quiser», logo, deus é que sabe e já tem tudo destinado há uns séculos atrás…
Acrescida e analogicamente, também não se pode pedir mais nada a deus…

Está clara a minha demonstração sobre a inanidade prática e teórica do conceito inventado de deus e suas implicações pluviais e outras?

ADENDA
Dizem os crentes, como já referi, que deus nos deu livre curso e, portanto, seríamos livres para venturas e desventuras, eximindo-se a criatura celeste a mais responsabilidades e ficando, os crédulos, mais tranquilos espiritualmente…
… Mas não ficam…
… Por causa do seguinte quesito:
– Será que deus também deu “livre curso” às forças naturais, geradoras de catástrofes???!!!
Se sim, também não há nada a reclamar de deus…
Se não, é um patifório cruento e incomparável… extensível, logicamente, à primeira hipótese… João Pedro Moura

7 de Março, 2005 Ricardo Alves

O Reino Unido não é laico

A diferença fundamental entre a República francesa e o Reino Unido foi confirmada numa decisão judicial que reafirmou o direito de uma jovem de origem bangladeshi a usar o «jilbab», um manto que a cobre de tal forma que apenas as mãos e o rosto ficam a descoberto. De acordo com o acórdão judicial, «[o Reino Unido] não é um Estado laico (…) as escolas têm o dever de assegurar que os alunos tenham educação religiosa, e que cada aluno participe numa oração colectiva por dia, a menos que o encarregado de educação peça escusa». A não laicidade do Reino Unido e o carácter confessional das escolas britânicas são reafirmados várias vezes ao longo do acórdão judicial, com o objectivo de distanciar o ordenamento jurídico britânico daquele que vigora na Turquia, na Suíça ou na França.
Shabina Begum, hoje com 16 anos, fora excluída da sua escola em Setembro de 2002, quando após a menarca aparecera na escola não com o traje tradicional que usara até então e que cobre os cabelos (o que é aceite na sua escola) mas com um traje mais longo (o «jilbab»), que lhe permite disfarçar também as suas formas corporais. A directora da escola, sendo muçulmana numa escola de maioria (a 80%) muçulmana, temeu que o exemplo desta jovem pressionasse outras alunas a aderirem às versões mais integristas do Islão. Significativamente, o irmão de Shabina, que é um militante da organização de extrema direita «Hizb ut-Tahrir», parece ter tido um papel crucial quer na conversão de Shabina ao fundamentalismo quer no processo legal, para o qual recrutou a advogada Cherie Booth (a esposa de Tony Blair).
Conforme se torna cada vez mais claro, só a assunção clara da laicidade e do papel da escola não confessional na transmissão de valores republicanos como a igualdade de género e a mistura entre rapazes e raparigas poderá fazer frente à ofensiva dos extremistas islamistas. E, nesse aspecto, a França está melhor preparada do que o Reino Unido.