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Mês: Março 2005

19 de Março, 2005 Palmira Silva

Direito a morrer

Ao fim de 15 anos num estado vegetativo permanente e irreversívelfoi ontem retirado o tubo que alimentava Terri Schiavo, a americana residente na Flórida que tem sido o centro de batalhas legais entre o marido e os pais, católicos fervorosos apoiados pelo Vaticano, pelos bispos americanos, pelo presidente Bush e toda a corte republicana.

O presidente Bush tem apoiado os movimentos católicos para manter Schiavo no estado vegetativo dos últimos 15 anos e afirmou que «continuará no lado que defende a vida» como informou o porta voz da Casa Branca, Scott McClellan.

O tubo que alimenta Terri Schiavo já foi retirado por duas vezes e depois reintroduzido. Em 2003 o governador da Flórida Jeb Bush, conseguiu passar uma lei que ordenou a reinserção do tubo, seis dias depois de este ter sido retirado. A lei foi depois considerada inconstitucional.

Desta vez os representantes republicanos ao Congresso tentaram impedir a remoção do tubo convocando Terry Schiavo para depor no Congresso no final no mês, o que a colocaria sobre protecção na condição de testemunha num inquérito do Congresso. Uma tarefa complicada já que ela não fala há 15 anos e é incapaz de alguma vez o voltar a fazer. Mas tal não deteve os republicanos, cuja manobra foi descrita pelo advogado de Michael Schiavo, George Felos, como «nothing short of thuggery».

Por todo o mundo os representantes de Vaticano lamentam a decisão e exortam os católicos a manifestarem-se já que Terry constituía um ex-libris da luta contra o aborto e eutanásia: «Se o senhor Schiavo tiver sucesso em provocar legalmente a morte de sua mulher, isso será não só uma tragédia em si, mas um passo grave na direcção da eutanásia legal nos Estados Unidos», declarou o cardeal Renato Martino, chefe do Conselho Pontifício para Justiça e Paz.

18 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

Não é nada disso

Afinal, a ICAR não está a promover nenhuma campanha para que não se leia nem se compre o «Código Da Vinci».

O que a arquidiocese de Génova se limitou a fazer, ao dar-se conta «da difusão deste livro nas escolas» foi tomar «medidas de reflexão e de confrontação pública também, aberta e decidida». Lá por Tarcisio Bertone ter dito «Não leiam e não adquiram o Código Da Vinci», não significa que exista uma cruzada contra aquela obra. Na verdade, a ICAR até é muito tolerante e sabe mostrar a outra face porque, citando o sociólogo americano Philip Jenkins, o senhor Bertone afirma que «o êxito do livro é só outra prova de que o anti-catolicismo “é a última discriminação aceitável”».

De qualquer maneira, apesar das mentiras escritas por Dan Brown, a ICAR é benevolente.

Pois…

18 de Março, 2005 Carlos Esperança

Numa paróquia de Lisboa


Imagem: origem desconhecida. Texto: padre Serras Pereira.
Adenda: A imagem, segundo informação recebida, é do cartoonista do «Avante» a quem felicito.

17 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

A resposta da PGR

No seguimento da carta, enviada pela Associação República e Laicidade ao senhor Procurador Geral da República, a propósito do «caso Lereno», a Procuradoria Geral da República informou que a queixa seguiu para a Senhora Procuradora-Geral Adjunta, Directora do Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa.

17 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

The three little shepherds

Descobri n’ A Ilha do Dia Antes que, depois de «A paixão de Cristo», em que Mel Gibson passa duas horas inteiras a mostrar aquela personagem a ser espancada e brutalizada das mais variadas formas (nunca vi um uso tão abusivo de molho de tomate), o realizador está a planear a realização de um filme sobre Fátima.

Parece que Mel Gibson ficou muito bem impressionado com a falecida vidente de Fátima, já para não falar que a sua morte renovou um certo interesse do público pela estória.

Ficamos ansiosamente à espera de mais notícias sobre um eventual «casting» de Catarina Furtado, actriz que já tem experiência neste assunto.

17 de Março, 2005 Ricardo Alves

Mitos americanos

(1) Sempre houve tolerância religiosa nos EUA
No século XVII, os Puritanos do Massachusetts enforcaram dois «quakers» que se recusavam a deixar a província. No mesmo século, os católicos estavam proibidos de praticar a sua fé em todas as colónias com as excepções de Rhode Island e da Pensilvânia, e o Massachusetts ameaçava executar todos os padres (católicos) que passassem pela colónia mais de uma vez. Apesar disto e das perseguições às bruxas de Salem, não falta quem acredite que os EUA, mesmo antes da independência, eram um paraíso de tolerância religiosa.
(2) A separação destinava-se a proteger as igrejas do Estado
A separação entre igreja e Estado conferida pela célebre «primeira emenda» não se destinava a proteger as igrejas do Estado (conforme afirmam alguns americanófilos menos informados), mas sim a proteger as igrejas umas das outras. O risco, à data da independência, era a predominância que uma igreja pudesse vir a ter sobre as outras usando o Estado.
(3) A população dos EUA sempre foi muito religiosa
A religiosidade da população dos EUA é um fenómeno posterior à independência, que atingiu o seu máximo no século XX. Na época da independência, apenas 17% dos habitantes dos EUA pertenciam a uma igreja. Por volta de 1950, esse número tinha subido para 60%.
(Publicado originalmente no blogue «Esquerda Republicana».)
16 de Março, 2005 Carlos Esperança

A ICAR actualiza o Índex


O Vaticano há muito que deixou de actualizar a lista dos livros proibidos. Condena, para não perder a vocação censória, desaconselha, para fingir autoridade, uiva, para impressionar os espíritos mais timoratos.
A Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, submetida ao pulso férreo do cardeal Joseph Ratzinger, piedoso inquisidor que se esforça para que o progresso e a liberdade não façam perigar o destino das almas, é uma pálida amostra do Santo Ofício, que a precedeu.

Agora, deu-lhe para embirrar com o «Código Da Vinci» do escritor Dan Brown, e inclui o interessante romance policial, que pisca o olho aos eruditos, na lista das obras a «não ler, nem comprar». O apelo foi feito pelo cardeal Tarcísio Bertone, aos microfones do Radio Vaticano, uma emissora do bairro com potência para ser ouvida através do planeta, mas cujas vozes não chegam ao Céu.

O que incomoda este santo cardeal, além das manipulações da ICAR que o romance desmascara, é a possibilidade de Jesus Cristo ter sido pai de uma filha de Maria Madalena, o que pressupõe o pecado da fornicação cometido pelo impoluto e casto fundador da ICAR.

Assim, ainda que a execração do livro e a proibição da compra contribuam para a sua difusão, a Cúria não pode deixar de actualizar o Índex dos livros interditos sob pena de conferir ao acto sexual a dignidade que a prática divina lhe outorgava. Deste modo, o «Index librorum prohibitorum» da Igreja Católica fica enriquecido com um novo título e a sexualidade de novo anatematizada.

16 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

Uma esmolinha, por favor

O reitor da Universidade Católica Portuguesa, ontem, disse esperar «que este novo Governo, que faz da liberdade o seu apanágio, olhe sem receio para a liberdade de ensino, enquanto liberdade de ensinar e de aprender». Numa cerimónia daquela instituição, agradeceu às famílias dos alunos a «coragem que tiveram em exercer o direito à liberdade de ensino», o que «implicou que tivessem de pagar duplamente, primeiro enquanto contribuintes do Estado e depois através das propinas».

A Universidade Católica Portuguesa é uma instituição de ensino superior privada. Por isso, deve encontrar meios para o seu próprio financiamento em nome dessa sua autonomia privada. Para além disso, a Universidade Católica é isso mesmo: católica. Ao pretender um estatuto de financiamento diferente das outras universidades privadas, está a entrar em rota de colisão com o princípio da igualdade e com o princípio da laicidade.

E há um outro factor a considerar: se o Estado não tem verbas para financiar os seus próprios estabelecimentos de ensino superior, como é que irá arranjar fundos para os privados?

16 de Março, 2005 Carlos Esperança

Momento Zen da Segunda

O sexo dos anjos e dos outros

Deixando o Domingo para o inefável padre Lereno Dias, o casto sacerdote que despreza a Constituição da República e adverte os fiéis sobre os partidos em que os católicos devem votar, João César das Neves (JCN) voltou às homilias da segunda-feira no seu artigo «o sexo dos anjos e o dos outros» – D. N de 13-03-05.

Apesar do título, não se deteve no sexo dos primeiros, quiçá por respeito, nem sobre as eventuais orgias em que possam envolver-se no espaço celestial. Foi sobre o «sexo dos outros» que concentrou o seu beato horror e manifestou a repugnância que lhe merece, salvo se o destino for a prossecução da espécie com activo repúdio do prazer ou qualquer manifestação de carácter libidinoso. Ele julga que Deus fica de mau humor sempre que os seres humanos procuram outro êxtase para além do místico.

JCN mereceria a simpatia dos espécimes em vias de extinção se o fanatismo não o tornasse tão abominável. Afirma que a Igreja é desprezada, o que é verdade e merece, mas acrescenta que é perseguida, quando, através da história, as grandes perseguições foram sempre entre bandos de fanáticos que se reclamam do mesmo Deus ou outros que acham o seu mais verdadeiro que o alheio.

JCN arremessa-nos com os evangelhos, os salmos, as epístolas, os profetas e demais fontes de idoneidade duvidosa para nos convencer do sofrimento da sua igreja e da bondade dos seus ensinamentos. Diz que a ICAR é acusada de ter sobre o sexo uma posição extremista e doentia o que, no seu piedoso entendimento, é injusto. Ora a posição da ICAR é abertamente demente e terrorista como o comprova à saciedade a sua posição em relação à contracepção, à SIDA, à homossexualidade, ao aborto e, inclusive, em relação a quaisquer relações sexuais onde o sacramento do matrimónio e a intenção reprodutora estejam ausentes.

JCN odeia o prazer, vê-o como pecado e toma-o como ofensa a Deus. Socorre-se da escritura, do catecismo, dos documentos pontifícios e de outras fontes, igualmente suspeitas e pouco recomendáveis, para provar a bondade da intolerância que exibe, a santidade da abstinência que recomenda, a superioridade moral do cristianismo que prega.

JCN talvez não saiba o que é amar. Se um dia sentir a divina consolação de um orgasmo, talvez abandone o proselitismo e se dedique à realização sexual sem a qual nunca mais o abandona esse rancor que lhe tolda a inteligência e embota a sensibilidade. Nesse dia deixará de importar-se com as pessoas da Santíssima Trindade, com o destino da alma e com as susceptibilidades do troglodita do seu Deus.