O Papa ensandeceu!
O último livro do Papa João Paulo II, a publicar na quarta feira pela editora do costume, a Rizzoli, e que reflecte a obsessão deste Papa em acabar com a laicidade, está já a levantar celeuma e protestos um pouco por todo o mundo. E suponho acabar por revelar-se contraproducente para os objectivos de uma Igreja de Roma que não se contenta em ditar normas anacrónicas para os seus crentes e que quer estender tentáculos de poder a todos. O tiro no pé reside na comparação, ignóbil e insane, entre o Holocausto e o aborto e na condenação da democracia.
Na sua ânsia em mostrar que os ditames da Igreja devem estar subjacentes ao Direito, obviamente não laico, e em atacar acefalamente a democracia, não ratificada pelas «leis divinas», João Paulo II escreve que «It was a legally elected parliament which allowed the election of Hitler in Germany in the 30s. The same Reichstag gave Hitler the power which opened the way for the political invasion of Europe, the creation of concentration camps, the introcution of the so-called ‘final solution’ to the Jewish question which led to the extermination of millions of sons and daugthers of Israel.».
Assim, depois de afirmar que não aceitar os ditames dos Evangelhos é uma nova forma de totalitarismo e que este novo totalitarismo está «insidiously hidden behind the appearance of democracy», conclui que «We have to question the legal regulations that have been decided in the parliaments of present day democracies. The most direct association which comes to mind is the abortion laws …». Acrescentando que «Parliaments which create and promulgate such laws must be aware that they are transgressing their powers and remain in open conflict with the law of God and the law of nature.»
Claro que o piedoso Papa se esqueceu de mencionar que Hitler chegou ao poder com o precioso auxílio do Partido Católico, Zentrum, liderado pelo monsenhor Klaas, que foi íntimo colaborador de Eugenio Pacelli (depois papa Pio XII) nos anos 20 e de outros partidos cristãos tal como manifestou o pio Pacelli depois das eleições para o Reichstag em 1932 «É expectável e desejado que, como o Zentrum, e o Bavarian People’s Party, assim também os outros partidos que se sustentam nos princípios cristãos e que agora incluem também o Partido Nacional Socialista, nesta altura o partido mais forte no Reichstag, usarão todos os meios de forma a impedirem a bolchevização cultural da Alemanha, que está em marcha pelo mão do Partido Comunista.»
Para além deste branqueamento imperdoável do papel dos partidos cristãos em geral e católicos em particular na ascensão ao poder de Hitler, o Papa dos cristãos menoriza de uma forma vergonhosa o genocídio nazi, insulta, com a habitual e expectável tolerância cristã, todos os que não consideram sagrado um óvulo fertilizado ou um embrião, chamando-lhes implicitamente neo-nazis. Claro que o insulto explícito a todas as mulheres que alguma vez abortaram apenas segue a norma de uma Igreja misógina que ainda hoje considera que a mulher se deve remeter a um papel menor como expiação do pecado original de uma Eva que a ciência já provou nunca ter existido!
Quero ver o que será dito amanhã na conferência de Imprensa convocada para apresentar o livro! Não podem imputar o imperdoável dislate a delírios provocados pela doença de Alzheimer já que no mês passado o insigne Cardeal de Colónia, Joachim Meisner, fez exactamente a mesma comparação, acrescentando à lista Stalin e Herodes, por mercê da sua mítica matança de recém-nascidos (que a História desmente!