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Mês: Novembro 2004

10 de Novembro, 2004 Palmira Silva

Mar Adentro – História de uma cabeça sem corpo

Recentemente, em Madrid, tive o privilégio de assistir à estreia do filme «Mar Adentro», do conceituado realizador espanhol Alejandro Amenábar.

Trata-se de uma história polémica, baseada na vida de Ramón Sampedro. Um homem que há anos atrás chegou a aparecer na televisão portuguesa e que volta hoje ao grande ecrã na pele de um actor que traz vida ao olhar enigmático de Ramón.

Ramón é um homem tetraplégico há quase três décadas, que não acredita na vida para além da morte. Dependente dos cuidados da família, a sua única visão do mundo é uma pequena janela do quarto, de onde sai uma ou duas vezes por ano. Enquanto jovem, viajou pelo mundo como marinheiro, mas, um dia, esse mesmo mar mudou o trajecto de uma vida, até então, excitante.

Após o incidente, o seu único desejo, morrer com dignidade, foi-lhe sempre negado pelos senhores da lei. Para Ramón, a vida é um direito e não uma obrigação, «sou uma cabeça sem corpo» – dizia. No entanto, duas mulheres vêm alegrar a sua vida e ajudá-lo na conquista de uma morte digna. Contra a decisão do tribunal, de não lhe conceder o direito à eutanásia, Ramón desenvolve um engenhoso plano que conta com a ajuda de onze amigos e sabe que quem o ama verdadeiramente é aquele que o ajuda na sua última viagem.

O filme premeia-nos, ainda, com um excelente diálogo entre Ramón e um padre paraplégico que tenta convencer o nosso herói suicida de que a vida pertence a Deus e só Deus tem o direito de a tirar. Não se lembrou, o mui distinto senhor padre, de que a instituição que representa sempre teve uma afinidade promíscua com a pena de morte.

Recordemos, então, brevemente, numa sala de cinema, este homem a quem saudamos e de quem temos saudades.

Um artigo de Aires Marques

9 de Novembro, 2004 Palmira Silva

Blasfémias

Nos últimos tempos alguns dos posts do Blasfémias têm motivado acesas discussões sobre religiões e relações religião/política. Gosto especialmente deste post do blasfemo CAA:

«o anti-clericalismo, numa cultura impregnada com o ar bafiento de sacristia como é a nossa, nada mais é do que uma forma sã e desempoeirada de abrir a janela da razão e conseguir respirar ar puro e, sobretudo, de combater o atrofiamento cerebral que colectivamente nos ataca há tanto tempo. Ora, acontece que o clericalismo – entendido como a devoção pela máquina administrativa que detém posição dominante no mercado das crenças, bem como a quase-adoração idólatra pelos seus agentes in personna – vivifica precisamente nesses ambientes intelectualmente entupidos.

Donde, o anti-clericalismo é um esforço válido de romper a má tradição do estado abúlico em que os portugueses estão submersos.

E nunca será fanatismo porque não conheço qualquer posição anti-clericalista que reivindique ter «visto a Luz». Esta imagem não faz nenhum sentido – quem julga ver «luzes» e ouvir «vozes» são os que pretendem encontrar em qualquer acaso um milagre e em qualquer cura uma intervenção divina, i. e. os devotos das crenças atreitos ao amor clerical.

Os anti-clericalistas só querem a boa separação das águas entre as crenças dos outros e as sua próprias vidas, entre o sagrado e o profano. No fundo, só desejam que os servos dos auto-intitulados intermediários com o divino os deixem em paz.

E ao contrário destes, nada pretendem impor, antes fazer pensar para melhor se poder optar.»

Um post que faz jus ao motto do blog, A Blasfémia é a melhor defesa contra o estado geral de bovinidade!

9 de Novembro, 2004 jvasco

Espiral de violência?

Espero bem que esta notícia do público sobre uma resposta, sob a forma de uma bomba, ao assassínio de Theo van Gogh, não signifique o início de uma escalada de violência.

Se as motivações religiosas do assassínio eram claras, e foram aqui veementemente condenadas, as motivações deste atentado, religiosas ou não, merecem também o nosso repúdio.

Duvido que a violência se alastre incontornavelmente, e que situações destas se voltem a repetir na Holanda a curto-prazo. Mas se estiver enganado, e em vez disso as tensões culturais e sociais se agravarem (como muitos receiam) ao ponto destes eventos terem sido apenas o início, não será a primeira vez que a causa dessa violência pode ser atribuída ao fanatismo religioso.

9 de Novembro, 2004 jvasco

A navalha de Occam

Kepler descobriu que os planetas circulavam em volta do Sol com órbitas elípticas. A terra não era o centro do mundo, e as órbitas não eram esferas perfeitas. Ele conseguiu isso através dos dados de Thyco Brahe, os mais precisos da época. Mas ele podia ter concluído outras coisas, ele podia ter concebido um modelo muito mais complexo, do ponto de vista matemático, no qual a terra fosse o centro do Universo, e que fosse coerente com os dados.

Em termos epistemológicos, hoje ainda podemos conceber a possibilidade de criar um modelo no qual a terra está no centro do Universo, o qual seja coerente com todos os dados experimentais até agora obtidos. De forma mais extrema, podemos supor que todos os corpos se movimentam ao acaso e que a força da gravidade foi uma gigantesca coincidência que se verificou até hoje, e que, curiosamente, se continua a verificar.

Epistemologicamente, no extremo, não podemos contradizer essa teoria, considerando-a falsa. Então porque é que essas parvoices são descartadas? Pelo princípio da navalha de Occam.

Entre duas teorias coerentes com a totalidade dos dados experimentais (obtidos no passado, ou que possam ser obtidos por experimentação acessível), escolhemos a mais simples, a que necessita de menos suposições e menos coincidências. É um princípio razoável e racional.

E, ao longo da história da ciência, tem-se mostrado muito útil e certeiro.

Podemos sempre supor que possa existir um Deus que é coerente com a sua ausência de manifestação até hoje.

Mas eu, enquanto não descobrir dados incoerentes com a hipótese mais simples (a sua inexistência) vou escolhê-la como a minha «hipótese de trabalho» ou seja, aquilo em que acredito.

Tal como em relação à existência da força da gravidade e demais leis físicas.

8 de Novembro, 2004 jvasco

Sobre o Mal…

«Se o mal é a ausência de Deus, então Deus não é omnipresente»

As religiões podem ter explicações simples e acessíveis para o mal. Mas essas explicações encorajam uma visão maniqueista e unidimensional do mal, visão essa que pode, em si, causar mal.

Esta página intitulada «à procura do mal» aborda precisamente esse problema. Mostra como as concepções do mal foram evoluindo com a história do pensamento, para acabar por mostrar como podem afectar a justiça e a aplicação da lei. Aconselho vivamente!

8 de Novembro, 2004 Carlos Esperança

Notas Piedosas

Holanda – O realizador Theo van Gogh foi sucessivamente baleado, esfaqueado e degolado como represália pelo documentário em que denunciou o tratamento bárbaro a que os muçulmanos do Magreb sujeitam as mulheres. O islão é uma religião de paz.

Évora – A abertura do ano escolar contou com um colorido travesti – o bispo da diocese -, que, com as vestes talares, deu um toque de exotismo às cerimónias fúnebres do início do ano lectivo. O que faz um bispo, numa universidade do Estado, sem estar matriculado?

Bíblia manuscrita – Os presidentes da República, da A.R. e do Tribunal Constitucional acolitaram o patriarca Policarpo na promoção comercial do maior êxito editorial de sempre, embora com poucos leitores. Os copistas, em vez dos 35.700 versículos, não fariam melhor em divulgar Camões, Aquilino ou Saramago?

Evangelização – Um crente entrou dentro de uma jaula de leões para lhes garantir: «Jesus irá salvar-vos». As feras, com pouca fome e menos fé, limitaram-se a arranhar o piedoso pregador, deixando-o nas mãos dos funcionários do zoo em vez de o enviarem directamente para o Paraíso.

8 de Novembro, 2004 jvasco

Baptizar ou não baptizar, eis a questão

Deverão os pais ateus, agnósticos ou cristãos baptizar os filhos? A opção que tomarem deve depender a da fé que têm? Devem dar a opção aos filhos? A partir de que idade deverão estes estar aptos a optar em consciência?

Actualmente, na generalidade, os pais cristãos baptizam os filhos pouco depois do nascimento, e os pais não-crentes não o fazem, preferindo esperar que os filhos tomem uma decisão a esse respeito.

A decisão dos cristãos costuma ser justificada recorrendo ao seguinte argumento: caso o filho acabe por escolher afastar-se da fé, não terá perdido coisa alguma em ter passado por um ritual ao qual não atribui qualquer significado espiritual.

A decisão dos não-crentes pode encontrar diferentes justificações (gosto muito das que são expressas neste texto), mas baseia-se, em geral, no respeito pelas decisões que os filhos queiram vir a tomar.

Em relação à atitude dos cristãos, o argumento que apresentam para justificar a sua opção não é mau de todo… Mas não é inteiramente correcto: sucede-se que a Igreja, para fins estatísticos, considera como «parte do rebanho» todos aqueles que se baptizaram, mesmo um não-crente que tenha sido baptizado em bébé contra a sua vontade.

Existe uma forma de dar a volta a isso, é possível desbaptizarmo-nos. Mas creio que a maioria daqueles que foram baptizados e deixaram de crer simplesmente não está para isso. Por essa razão, considero que seria mais honesto que as diferentes igrejas cristãs deixassem de considerar como crentes todos aqueles que se baptizaram. As respostas nos censos, com todas as suas limitações, são indicador muito mais fiável do número de crentes.

De resto, colocam-se algumas questões aos pais não-crentes: imaginemos que o filho se quer baptizar. Os pais deverão permitir que o filho o faça assim que o quiser, ou deverão esperar que ele tenha determinada idade, para que tenha plena consciência da sua decisão? Que idade é essa? A questão também se complica se pensarmos nos rituais de iniciação de outras religiões. Nesse caso a decisão pode ter efeitos práticos mais visíveis, e ser irreversível. A circuncisão é tolerada na nossa cultura, mas a excisão já nos parece bárbara de mais (embora se pratique nos bairros degradados de Amadora e Oeiras, por exemplo).

Muitas religiões encorajam os pais a tomarem estas decisões pelos filhos, mesmo quando os filhos, caso deixem de ser crentes, não possam simplesmente ignorar as consequências dos ritos de iniciação, ou lamentá-las profundamente. A lei portuguesa concede auto-determinação religiosa aos 16 anos. Será demasiado cedo ou demasiado tarde?

PS: Não esqueçamos que há religiões que não aceitam a apostasia e que a punem com a morte…

7 de Novembro, 2004 Carlos Esperança

Deus está em parte incerta

Deus, cansado das asneiras que fez, das maldades que praticou ou envergonhado dos seus preconceitos, afastou-se para lugar incerto e, depois da invenção da escrita, nunca mais deu sinais de vida. A Revolução Francesa veio criar um habitat incompatível com a presença divina. O sufrágio universal reduziu-o à sua insignificância e, por não se ter inscrito nos cadernos eleitorais, passou a valer menos do que qualquer eleitor.

Aqueles truques que fazia no Mar Vermelho, as brincadeiras com que embasbacava os primitivos, contrariando as leis da Física, os milagres que exibia para estupefazer os terráqueos, tudo isso foi sendo desmascarado pela ciência ao mesmo tempo que o progresso criou espaços de liberdade que um Deus violento e autoritário não podia suportar. Tal como o patrão que arruinou a fábrica, desapareceu, indiferente à sorte dos operários e fiéis servidores, e nunca mais foi visto nem levado a juízo.

Claro que os empregados mais devotos, os espíritos mais timoratos e os oportunistas mais descarados continuaram a garantir a sua existência e a ameaçar com os castigos de que ele era capaz. Procuram fabricar indigentes mentais como os que em Portugal esperam por D. Sebastião ou aliciar oportunistas com benefícios garantidos, mas sem grandes resultados práticos.

A excomunhão e a fatwa são duas armas que permanecem carregadas de ódio, o Inferno é ainda um destino com que os clérigos assustam os incréus, a penitência e a oração continuam a fazer parte das penas suaves, sempre que meios mais expeditos não são consentidos: a lapidação, a fogueira, a decapitação, a amputação de membros, a explosão bombista e outras manifestações da justiça, aviadas a mando de clérigos com procuração divina, para supremo deleite do Todo-Poderoso.

Ultimamente Deus começou a imiscuir-se, em rigorosa clandestinidade, nos processos eleitorais. Em países democráticos faz pender o prato da balança eleitoral para o lado pior, nos outros vai impedindo eleições com o argumento de que a lei divina não é passível de julgamento pelos homens. Há suspeitas de que Deus visitou recentemente os EUA, passa largas temporadas no Médio Oriente, percorre os países mais pobres de África e anda em campanha por algumas repúblicas da antiga URSS. Onde lhe cheirar a sangue, Deus não falta, para dilatar a crueldade.

Há, contudo, um método, destinado à multiplicação da espécie humana, que lhe saiu mal – a reprodução por estaca (usou um ramo «costela» de um indivíduo para o duplicar). Os humanos descobriram outro método muito mais fácil e imensamente mais agradável. Dizem os beatos que é um método obsceno, apenas tolerável para fazer filhos e nunca para obter o mais leve prazer. Pensa-se que este método tinha-o Deus reservado para o fabrico de tractores mas os humanos apropriaram-se dele muito antes de os tractores terem sido inventados sem ajuda divina.

6 de Novembro, 2004 Palmira Silva

Génese do Fundamentalismo

«Primeiro eles vieram atrás dos comunistas e eu não disse nada porque não era comunista.
Depois vieram atrás dos judeus. E eu não disse nada porque não era judeu.
Depois vieram atrás dos sindicalistas. E eu não disse nada porque não era sindicalista.
Então vieram atrás de mim. E já não havia mais ninguém para falar por mim.
» Martin Niemöller, pastor protestante alemão em resposta à pergunta como foi possível o Holocausto.

Um epifenómeno de crises económico-sociais consiste na eclosão de movimentos (religiosos, políticos e, principalmente, misturas explosivas de ambos) que se caracterizam por um radicalismo intolerante, um integrismo de todos os aspectos do quotidiano da polis e a assunção do papel de protectores e detentores da VERDADE ABSOLUTA. Este fenómeno, na sua vertente explosiva, agudizou-se nos últimos anos por todo o globo, propiciado por factores políticos, económicos e culturais sortidos, que exponenciaram a adesão a movimentos religiosos em que os crentes, professando a aceitação da verdade revelada (re)interpretada por esses grupos, se amparam emocionalmente numa grande família de fiéis, satisfazendo o ancestral sentimento de pertença.

Estes movimentos, a que nos habituámos designar por fundamentalistas, podem ser encontrados na Cristandade ocidental (Protestante ou Católica), no Judaísmo, Budismo, Hinduísmo e, sobretudo, no Islão. O fenómeno do fundamentalismo religioso, em especial o terrorismo de inspiração religiosa, é assim um dos mais sérios problemas contemporâneos, afectando em menor ou maior grau todos os países, e colocando questões de difícil resolução à Comunidade Internacional.

Hoje alargada para além do seu significado original, a expressão «fundamentalismo» remonta ao princípio do século XX, mais concretamente a 1909, data em que foram redigidos os «Fundamentals» textos de natureza doutrinária elaborados por teólogos de confissões protestantes. Estas publicações pretendiam consagrar o património sagrado insusceptível de negociação, passando os seus apoiantes e seguidores a serem conhecidos por «Fundamentalists».

Os movimentos religiosos que se apoiaram nestes documentos passaram a defender a doutrina do literalismo bíblico. Ou seja, foi reforçado o facto de a Bíblia ter inspiração divina, e portanto, infalível em todas as questões, isto é, «a Bíblia nunca se engana». Por outro lado, estes movimentos protestantes norte-americanos assumiriam uma postura que viria a ser muito característica dos movimentos fundamentalistas, e que se prende com a sua natureza política. Os fundamentalistas caracterizam-se pela sua oposição a tudo o que possa, de alguma forma, colocar em causa a autenticidade e pureza dos valores religiosos e da subjacente filosofia de vida suposta «superiormente» determinada. Como tal, são visceralmente opostos ao laicismo.

A origem dos fundamentalismos em sentido lato pode ser encontrada no Wahabismo (ou salafismo, como foi exportada para o exterior esta vertente do islamismo), que advoga uma interpretação literal do Corão e dos preceitos islâmicos. Fundado por Mohammad ibn Abd al Wahhab em meados do século XVIII, cuja aliança com Mohammad ibn Saud, ofereceu aos Saud uma missão religiosa claramente definida na qual eles basearam (e baseiam) a sua autoridade política.

Mas os fundamentalismos com expressão nacional, que constituem hoje em dia uma das principais fontes de violação dos direitos e liberdades fundamentais já que assentam na transposição para o âmbito jurídico e político de dogmas religiosos, como a Sharia, não se esgotam nos vários fundamentalistas islâmicos. E nem sempre correspondem a ditaduras impostas. Podem ser sufragados como testemunhámos há uns anos na Argélia e é o cenário mais provável no Iraque actual… E esperemos ardentemente que o não tenha sido na nação que primeiro adoptou a laicidade!

Mesmo a laica Europa, nomeadamente os países em que a religião dominante é o suposto mais moderado catolicismo (do concílio Vaticano II) não estão imunes à ameaça do fundamentalismo religioso. Como demonstrou o episódio Rocco Buttiglione e reiteram os discursos, cada vez mais frequentes, de altos dignatários da Igreja de Roma que apontam a laicidade como fonte dos males da Europa e do Mundo.

Faleceu há uns dias o padre francês Louis Bouyer que, em 1968, previa o advento do integrismo católico como reacção ao «laicismo» provocado pelas reformas do Concílio Vaticano II, expresso no livro polémico: «A decomposição do catolicismo».

De facto, uma das faces do fundamentalismo católico é o Integrismo Católico, com principal mentor no Arcebispo Marcel Lefebvre. Na obra «Acuso o Concílio», Lefebvre expõe uma suposta conspiração que culminou na aprovação de um conjunto de reformas que ameaçam a Igreja Católica, reformas essas inspiradas em movimentos que a pretenderiam de facto destruir: o modernismo, a laicidade e o liberalismo.

Os sinais da negação do concílio Vaticano II são fáceis de ler. Em pormenores aparentemente tão irrelevantes como a quase consumada revogação da Novus Ordo Missae de Paulo VI iniciada pela Instrução da Congregação para o Culto divino Redemptionis Sacramentum que reafirma a encíclica «Ecclesia de eucharistia», na qual são condenados veementemente os intitulados «abusos litúrgicos».

Mas pormenores que se repetem na encíclica «Veritatis splendor» que condenou todas as orientações progressistas no campo da moral cristã. Ou na «Fides et ratio», que reafirma o valor do conhecimento místico intrínseco à fé. E no pedido do Papa João Paulo II aos seminários de Teologia para retomarem enfaticamente o estudo de Tomás de Aquino e, consequentemente, a defesa dos valores cristãos medievais. E finalmente na «Dominus Jesus», documento da Congregação para a Doutrina da fé que nega o ecumenismo e afirma a irredutibilidade do Cristianismo a apenas mais uma religião dentre as outras, a um pensamento de algum modo assimilável a outras mensagens religiosas.

Com expressão crescente em Portugal existem outras faces (menos explícitas) do fundamentalismo católico, a Opus Dei e o Movimento Comunhão e Libertação. E, como nos alerta um post de leitura indispensável do Pula Pulga, Os subterrâneos da escravidão, continuado n’Os Buttiglione de cá:

«A Comunhão e Libertação tem ramificações bem definidas no tecido social português. Lá, nos subterrâneos da escravidão, trabalha-se afincadamente. Cá, onde nos entretemos com os blogs, cremos que os subterrâneos da liberdade fazem parte de uma história longínqua do autor de Gabriela, Cravo e Canela. Podemos despertar tarde de mais.»