Os últimos dias serão lembrados na Tailândia como dos mais violentos da história de (mais) um conflito de origem religiosa. Uma série de explosões atingiu hoje alvos civis nas províncias de Yala e Narathiwat.
A violência em três províncias do sul da Tailândia causou a morte de mais de 500 pessoas desde Janeiro último, quando foi reavivado um conflito adormecido entre budistas e muçulmanos.
A escalada de violência conheceu um pico em 25 de Outubro quando 78 muçulmanos morreram sufocados em camiões do exército tailandês apinhados, na sequência de confrontos entre a polícia e manifestantes que exigiam a libertação de seis detidos por suspeita de fornecimento de armas aos rebeldes separatistas muçulmanos.
O movimento separatista Islamic Pattani United Liberation Organisation (PULO), desde então tem cumprido a sua promessa de intensificar os ataques. De início dirigidos a alvos militares e policiais (para roubo de armamento) mas actualmente visando civis budistas, que têm sido barbaramente assassinados, nomeadamente por decapitação.
“Eles querem deixar-nos com raiva, querem fazer-nos usar a força bruta e, depois, espalhar a notícia. Então, os simpatizantes deles no exterior dar-lhes-ão mais apoio”, afirmou o primeiro-ministro tailandês.
A Reforma e a Contra-Reforma originaram duas Europas ocidentais totalmente distintas quanto ao tratamento da diferença religiosa. A norte, a dissidência protestante depois de maioritária tolerou (relativamente) quer o catolicismo de onde dissidira, quer o judaísmo (infímo), quer as novas dissidências protestantes. Ao sul, a uniformidade católica foi a regra estatal e a Inquisição o método para lidar com todos os desvios à ortodoxia.
A partir do século 18, o fim das monarquias de direito divino só foi conseguido, nos países latinos, contra uma ICAR hegemónica, enquanto as sociedades do norte da Europa, tendo resolvido a tensão religiosa há muito através da tolerância religiosa, não sentiram a necessidade de uma ruptura laicizante. Porém, a liberdade de pensar já não produzia apenas crenças novas mas também agnósticos e ateus assumidos…
Chegamos assim ao século 20 com uma Europa do norte em que as escolas (e nalguns casos as zonas residenciais) estão segregadas em função da religião (sendo esta muitas vezes obrigatória dentro da escola), perpetuando o desenvolvimento separado de comunidades religiosas. Um caso típico é o da Irlanda do Norte, com os resultados práticos conhecidos. No sul europeu, a escola pública tende a ser uniforme para todos, e assume-se como um local em que as pertenças religiosas podem (ou até devem) ser deixadas à porta. O exemplo clássico será a França, onde a escola laica é encarada como a «forja» dos futuros cidadãos.
A chegada de imigrantes à Europa nos últimos cinquenta anos veio portanto testar modelos nacionais de integração social longamente amadurecidos mas fortemente diferenciados, que vão do comunitarismo anglo-saxónico (e holandês) à laicidade latina mais ou menos mitigada. O acolhimento dos imigrantes é também, inevitavelmente, distinto. Existem escolas muçulmanas financiadas pelo Estado na Holanda, e nas escolas estatais francesas o véu não entra… Ao primeiro modelo chamamos hoje multiculturalista, e ao segundo laicidade. O primeiro mantém ateus em escolas religiosas, o segundo não. O primeiro fecha os imigrantes na sua religião de origem, o segundo possibilita que a abandonem.
Vaticano – JP2, ao receber hoje Jorge Sampaio e a Esposa, fazendo um acto de contrição perante a anterior recusa de receber uma divorciada, pediu que «a luz de Fátima se propague por todo o mundo…». Confundiu o chefe de Estado com um electricista e Portugal com a EDP.
Fátima – Correspondendo ao pedido dos anjos e de Nossa Senhora, está prevista para o próximo dia 20 de Novembro uma adoração eucarística a «Jesus Escondido», na basílica do Santuário, pelas crianças de Fátima. A organização conta com o apoio especializado do Santuário, da respectiva paróquia e do Movimento da Mensagem de Fátima (MMF), agências especializadas neste tipo de eventos. São esperados 750 meninos e meninas na companhia de familiares e catequistas – revela a agência Ecclesia. Como as crianças adoram jogar ao «esconde-esconde», a adoração eucarística ao «Jesus Escondido» será o momento alto das actividades lúdicas a que não faltarão rezas ao Santíssimo Sacramento e outros divertimentos espirituais.
Nota pastoral – «Portugal soube sempre acolher-se ao regaço da Mãe de Jesus» – diz a Conferência Episcopal Portuguesa, esquecendo que a maioria dos portugueses prefere outros regaços menos compatíveis com a fé e a salvação da alma. Compreende-se que os senhores bispos, a quem a idade e o múnus tornou castos, acreditem, tanto mais que em Coimbra, no séc. XVII, fez-se um «juramento a que se obrigou o corpo docente da Universidade de Coimbra – de defender e ensinar que Maria fora concebida sem pecado». Ainda hoje há lentes que, sem a obrigação do juramento, estão convencidos de que Maria concebeu sem pecado, considerando as mães dos seus próprios filhos umas desavergonhadas pecadoras.
O assassínio do cineasta Theo van Gogh despoletou uma tensão, por muitos descrita como étnica mas na realidade religiosa, nunca conhecida numa Holanda encarada como o paradigma da tolerância, da liberdade de opinião e de expressão, da integração de todos com absoluto respeito pelas suas especificidades culturais.
Todos os paradigmas se desmoronaram em escassos dez dias… O bárbaro, injustificado e injustificável assassínio do realizador, por motivos puramente religiosos, está a ser lido pelos holandeses como um aviso de guerra, uma ameaça aos valores da sua sociedade multicultural e tolerante com que não estão dispostos a compactuar.
Na carta cravada a talhe de carniceiro no corpo de van Gogh são dirigidas ameaças explícitas a Ayaan Hirsi Ali, sendo igualmente visados outros políticos considerados «inimigos do Islão», Geert Wilders, a ministra da Imigração, Rita Verdonk, e o prefeito de Amesterdão, Job Cohen (de origem judaica).
O ministro da Justiça holandês, Piet Hein Donner, depois de a ler, afirmou numa conferência de imprensa que «A carta expressa uma ideologia religiosa extremista e nela os inimigos do Islão são advertidos de que devem temer pela sua vida» acrescentando que «contém ameaças e cita a ‘guerra santa’ lançada pelos muçulmanos extremistas».
O atentado contra Theo van Gogh, assumidamente assassinado por se atrever a expressar a sua opinião sobre a religião islâmica, suscitou na Holanda o medo de uma situação semelhante à vivida nos Balcãs, onde o reacender dos conflitos religiosos entre bósnios muçulmanos, sérvios ortodoxos e croatas católicos foi o rastilho da sangrenta guerra que resultou no desmembrar da Jugoslávia.
A resposta do governo holandês foi imediata, nomeadamente no reforçar das medidas de segurança e policiais. Mas também foi decidido retirar a nacionalidade holandesa a todos os emigrantes que ajam contra os interesses do estado e obrigar os imãs a falar holandês nas mesquitas. E a ministra Rita Verdonk afirmou, numa conferência sobre integração, que toda a Europa deve combater a radicalização de jovens muçulmanos, já que «a Europa não se pode converter num reduto de terroristas muçulmanos» e que «os governos Holandeses foram muito ingénuos ao dedicar pouca atenção aos elementos radicais na sociedade».
Enquanto os holandeses fazem a sua introspecção à procura de uma resposta para o que correu mal neste país com uma tradição centenária de tolerância, berço de pensadores humanistas revolucionários, como Erasmus ou Spinoza, a imprensa internacional quasi que ignora o sucedido reservando as manchetes para o funeral de Arafat e outras minudências. Com alguns periódicos europeus, por exemplo o diário dinamarquês Politiken, a compararem a investigação policial na capital internacional da paz, Haia, à noite de Cristal nazi. Com excepção da imprensa espanhola, claro, especialmente porque existem suspeitas de ligação entre os autores do atentado que abalou a Espanha e o grupo a que pertence o assassino de van Gogh. O El Mundo escreveu esta semana que «toda a Europa se deve espelhar na Holanda para evitar que o mal se propague ainda mais».
O fundamentalismo religioso, seja de que confissão for, é a pior ameaça à humanidade na actualidade. O reconhecimento inequívoco deste facto, sem reacções de avestruz ou complexos «les main sales», urge ser feito! Há assuntos cuja gravidade não lhes permite serem tratados de forma «politicamente correcta», até porque este é um problema religioso que os fundamentalistas islâmicos tentam capitalizar transformando-o numa questão étnica (que o não é).
Não nos podemos deixar manipular e manietar por fanáticos de qualquer religião por medo que esgrimam (falsas) acusações de racismo, intolerância ou discriminação. Assim como o parlamento europeu rejeitou Rocco Buttiglione deve responder de forma ainda mais firme a estes atentados (mais graves) contra os valores e direitos fundamentais defendidos por uma Europa aberta, laica, pluralista e tolerante. Antes que seja demasiado tarde, porque este não é o episódio isolado e irrelevante que o silêncio da maioria dos fazedores de opinião faz subentender…
Publicado pela primeira vez, no NRC Handelsblad em Holandês.
A minha reacção inicial de choque e descrença deu lugar a um sentimento de dor intensa. Estou a sofrer pela morte de Theo. Sofrendo porque, agora, ele não pode ir para a América com o seu filho. Porque ele teve que morrer para focar a atenção de todos na presença de indivíduos cuja convicção religiosa é para eles muito mais importante que a vida humana. Eu sofro porque outra vez a Holanda perdeu a sua inocência, uma inocência da qual Theo era um expoente.
Os ataques terroristas na América e em Espanha foram olhados como algo que só poderia acontecer lá, mas não aqui. A ingenuidade de Theo não era de que não poderia acontecer aqui, mas que não iria acontecer a ele. Ele dizia-me: “Eu sou o idiota da aldeia; eles não me vão tocar. Sê cuidadosa, tu é que és a apóstata e mulher.”
Eu sofro porque eu e os nossos amigos comuns, não podemos congratulá-lo do seu novo filme “0650,” do qual ele estava muito orgulhoso, mas também estou zangada, porque ele está morto e eu estou viva. Eu sei que estou viva porque tenho protecção policial e ele não a tinha.
Estou zangada porque ele foi morto num assassinato ritual. Estou zangada porque ouço o responsável da justiça dizer que não tinha instruções para proteger Van Gogh. Estou zangada pela pobre desculpa de que Van Gogh não queria nenhuma protecção para ele, porque eu sei que pessoas em risco, políticos, são forçados a ter essa protecção, quer queiram, quer não, o que protege não só a as suas vidas, mas também a ordem pública e a segurança nacional.
Poderia a morte de Theo Van Gogh ter sido evitada? Havia indicações suficientes de que ele deveria ser protegido? Em 30 de Agosto, um dia depois das transmissões dos “Convidados do Verão”, incluindo a da “Submissão, Parte 1”, a foto de Theo Van Gogh foi colocada num site islamista debaixo da minha fotografia. A minha foto era comentada como a “A maligna e infiel Mortadda” e a dele “o maligno infiel Ribald”.
Vinte e dois investigadores foram postos a descobrir quem era o responsável.
Eu fiz uma queixa à polícia e o responsável foi condenado a nove meses de prisão. Foi Theo consultado por causa disto? Será que ninguém considerou que a vingança era iminente, não só por causa do filme, mas também porque um deles tinha sido preso?
Eu estou zangada porque sei que o assassino não está sozinho: ele é membro de uma rede de muçulmanos que estão profundamente embrenhados nas suas crenças, e que caminham pelas ruas com a intenção de matar pessoas inocentes. Além disso o assassino pode preparar o seu crime com o conhecimento de amigos e conhecidos, pessoas que por elas próprias não matariam outras pessoas, mas que não se importaram com a morte de Theo. Este facto faz do assassínio de Van Gogh, muito diferente das ameaças de activistas dos direitos dos animais a políticos, ou de cartas com balas enviadas para a polícia. Essas duas ameaças podem ser controladas. O terrorismo islâmico, tanto na Holanda como fora dela, consegue crescer e sobreviver porque está integrado num círculo maior de muçulmanos amigos. Estou zangada porque este facto nunca é completamente compreendido pelas pessoas responsáveis pela nossa segurança.
Sinto-me culpada quando abordei Theo com o script para o filme “Submissão”. E, agora, ele morreu por causa dele. Mas na fria luz da manhã, eu sei que só o assassino é culpado da sua morte.
Instintivamente, isso é-me confuso. Theo e eu discutimos profundamente as possíveis consequências do filme para ambos. Ele dizia: “Logo que estas considerações te dissuadam de exprimires a tua opinião, não é esse o fim da tua livre expressão? Isso é milho para a mó dos islamistas.”
Eu estava preparada para ir muito longe para que as pessoas se levantassem e notassem: as autoridades holandesas que têm de se aperceber que o Islão radical e os seus apoiantes se instalaram na Holanda; a população islamita, que deve aprender a ver as horríveis marcas de nascimento da sua própria religião.
A população islamita deve aperceber-se de que as suas desvantagens não são uma função ou consequência de uma crença fraca em Deus, ou de discriminação, como os radicais desejam que aconteça, mas em parte é a consequência das suas próprias acções. O tratamento do indivíduo, a posição social das mulheres, a criação de guetos como as escolas islâmicas, são esses os factores que explicam o atraso da comunidade islâmica em relação às outras.
Theo concordava comigo em todos estes pontos. À sua maneira, e como realizador de cinema, ele tentou, na medida do possível, não se isolar da juventude islâmica mas comunicar com ela.
Eu sinto-me culpada porque abusei da sua falta de medo, porque eu sei que qualquer um que critique a escritura sagrada, está num grande perigo. Um homem foi morto de uma maneira abominável, simplesmente por causa do que acreditava. Isto é relativamente novo na Holanda, mas nos países islâmicos é parte da vida de todos os dias.
Hoje, embora os extremistas ainda sejam uma pequena minoria entre os nossos concidadãos muçulmanos, a influência potencial dentro desse grupo é enorme.
Sob o título «A América que não muda» (Público, 10/11), José Pedro Zúquete (JPZ) justifica com comovente ternura a vitória de Bush com argumentos certamente procedentes e, outros, de beata motivação e manifesta debilidade.
Entre estes últimos encontram-se os que atribuem aos EUA uma religiosidade que lhe terá sido legada pelos fundadores, na sua grande maioria ligados à maçonaria, livres-pensadores e defensores do laicismo, valores que impregnam a Constituição americana e constituem a marca genética dos princípios democráticos, liberais e tolerantes que a caracterizam.
Há, aliás, uma evidente contradição quando JPZ afirma que «desde o início houve a separação da Igreja e do Estado» imediatamente após ter afirmado que «desde o início da história americana que a política abraçou a religião», fazendo tábua rasa do carácter laico, historicamente pioneiro, da Constituição.
Muitas das «figuras sagradas» dos EUA a que alude foram agnósticas e, entre as maiores, houve quem considerasse o cristianismo como um conjunto de meras superstições. Mas, na ânsia de reescrever a história do grande país e justificar os desvios recentes, JPZ não hesita em apoiar-se nas referência religiosas que acompanham os símbolos da soberania como se essas referências fossem uma herança da fundação e não tivessem aparecido apenas no séc. XX sob influência de radicalismos religiosos.
Atribuir a um país com uma constituição profundamente laica carácter não laico, o que a deriva metodista e outros fundamentalismos evangélicos se esforçam por desvirtuar, é uma mistificação que serve os desígnios de um proselitismo agressivo e trai a verdade histórica e os princípios de tolerância religiosa de que os EUA são herdeiros.
Quanto à ligação que JPZ estabelece entre Deus e liberdade e entre democracia e religião, deve esquecer-se que a Bertrand Russell foi negada a liberdade de ensinar nos EUA, por ser ateu, e que a religião que obriga ao estudo do criacionismo bíblico e, se possível, à proibição do estudo do evolucionismo não é certamente uma referência democrática nem um caminho recomendável.
«A América que não muda» é apenas a América que mudou. Para pior.
A autoridade palestiniana declarou a morte de Yasser Arafat.
Que irá agora acontecer nesta zona tão conturbada do globo com a morte do carismático líder palestiano, cuja aversão a rivais impediu uma sucessão clara e incontestada? Será que vai emergir o líder forte que permita as negociações efectivas da paz que Israel sempre reclamou ser impossível com Arafat? Ou os conflitos alargar-se-ão a disputas internas pela liderança palestiniana? As próximas horas podem ser cruciais…
(via Blasfémias)
Os afegãos usufruiram durante pouco mais de um ano do direito a este entretenimento proíbido pelos talibãs. O que faz duvidar se de facto acabou o reinado dos talibãs no Afeganistão…
Na sequência de uma explosão que ocorreu no decurso de uma operação policial anti-terrorismo, o espaço aéreo sobre a cidade de Haia está fechado ao tráfego de aeronaves civis.
As autoridades holandesas não explicitaram se a operação antiterrorista está relacionada com o homicídio do realizador Theo Van Gogh por um cidadão de 26 anos com dupla nacionalidade marroquina e holandesa, que despoletou uma onda de violência por toda a Holanda.
A espiral de violência de que duvidava o João Vasco ainda ontem parece ter começado…
O Diário de uns ateus é o blogue de uma comunidade de ateus e ateias portugueses fundadores da Associação Ateísta Portuguesa. O primeiro domínio foi o ateismo.net, que deu origem ao Diário Ateísta, um dos primeiros blogues portugueses. Hoje, este é um espaço de divulgação de opinião e comentário pessoal daqueles que aqui colaboram. Todos os textos publicados neste espaço são da exclusiva responsabilidade dos autores e não representam necessariamente as posições da Associação Ateísta Portuguesa.