O kitsch religioso da semana
Vinha a descer a avenida Lourenço Peixinho, em Aveiro, quando passei pela montra de mais um bric-á-brac chinês e eis que este Cristo me surpreende!
Num canto, rodeado de ditados de Confúcio, o Cristo encontra-se cercado, sem ter hipótese de fuga. Um caractere chinês encosta-se à jugular…
Definitivamente não há escapatória possível. Com 1.3 mil milhões de chineses no mundo não podemos fugir deles. Tal como eles não podem fugir de nós. O Cristo está pendurado na montra da loja, como sinal de boa fé. Os aveirenses são conservadores, e como é habitual, na sua população abundam certos extremismos. Os comerciantes, esses sábios da tolerância, usam os sinais sagrados dos outros para serem aceites e adoptados.
O Cristo, no entanto, dado o contexto, parece pedir ao pai por outros tempos. As sociedades multiculturais são tão aborrecidas…
É-se só mais um deus, no meio de tantos. Porque é que o pai o pôs em tal situação, de que não estava à espera!?
Um dos factores de crescimento da descrença na Europa, foram os Descobrimentos. Quando começaram a ser publicados relatos de viagens, de terras com povos estranhos, com deuses e sem deuses, o argumento da apologética cristã medieval de que o monoteísmo messiânico era implícito a qualquer ser humano caiu por terra. Hoje, nem sequer nos lembramos dele. Só encontramos alguns ecos seus nos argumentos do tradicionalismo esotérico (bem disfarçadinhos, claro). Em retrospectiva, percebemos porque a igreja correu para converter os novos mundos. A ameaça da diferença e logo da descrença eram demasiado reais. Escolheu-se a iniciativa, ao invés da defensiva. A um conquistador todos os povos parecem inferiores.
Ao império do meio, a China, o sistema imperial escolheu a estratégia inversa. A defensiva.
De nada lhes valeu.
A globalização é um fenómeno estranho. É uma onda de mudança imparável.
E só sobrevive quem souber mudar. E é melhor mudar por escolha própria, do que a isso ser obrigado.
Alguém seguirá as regras do feng shui, ao instalar o poster de «cantor de rock and roll» do Cristo.