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As relíquias da ICAR estão a baixar a cotação



A bolsa de valores religiosos tem sofrido, com os tempos, uma lenta erosão no que diz respeito às relíquias, que envaideciam os proprietários e levavam a confiança aos domicílios onde repousavam.

Tempos houve em que a febre das relíquias deu origem a um próspero negócio e à criação de uma indústria de falsificações cujos exemplares rivalizavam com os verdadeiros a conceder graças e a obrar milagres.

Assim se distribuíram por paróquias uma dúzia de braços de S. Filipe, só ultrapassado por Santo André a quem colocaram 17 para gáudio e piedade de crentes de igual número de paróquias.

Às vezes eram bizarras as relíquias, mas não menos inspiradoras de piedade, como aconteceu com o rabo do burro que carregou a Virgem Maria, com uma pena de asa do arcanjo Gabriel ou com as línguas do Menino Jesus. Mas foi a piedade, a imensa piedade, e a raridade de peças genuínas no mercado, que levou Santa Juliana a ter 40 cabeças dispersas para piedosa contemplação dos crentes.

Nem vale a pena falar do santo Prepúcio, relíquia comovedora, por ter pertencido a Jesus Cristo. Dos vários que houve (prepúcios, porque JC só houve 1), a um único foi passado certificado de garantia e, depois, até esse foi declarado falso. Entenderam os cardeais que JC não poderia ter ressuscitado sem ele e, a partir daí, pairou a ameaça de excomunhão para os crentes que se lhe referissem, mesmo para os que tinham obtido graças por seu intermédio.

Enfim, as relíquias da ICAR, quase sempre a roçar o macabro, peças de santos desidratadas ou mumificadas, estão hoje com cotações tão baixas que arruinaram o mercado das falsificações. Só as peças de santos e beatos fabricados no pontificado de JP2 exigiriam armazéns imensos e uma rede de frio de invulgar capacidade para as conservar. Ficaria mais cara a armazenagem do que o valor da mercadoria.

Na primeira visita que fiz a Itália, há mais de 30 anos, fartei-me de ver relíquias, ao mesmo tempo que me inebriava com a beleza das pinturas e esculturas que decoravam magníficas catedrais onde várias vezes voltei deslumbrado pela beleza, desprezando a piedade.

Mas foi na primeira vez que, depois de muitos ossos exibidos, a guia obrigou o grupo a observar um esqueleto inteiro, em excelente estado de conservação, devido às virtudes que em vida exornaram o proprietário. Mais importantes do que as graças que concedia eram os exemplos de piedade que tinha deixado. Era o orgulho da paróquia, uma pequena localidade próxima de Nápoles, pertença de uma pequena comunidade que possuía uma igreja e relíquias de fazer inveja a muitas cidades.

Estava a guia empolgada, a falar das virtudes do santo cujo esqueleto exibia, quando alguém lhe perguntou de quem era um esqueleto mais pequeno que se encontrava próximo. Sem perder o fio à meada, respondeu de imediato:

– Era do mesmo santo, quando era mais novo.

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- Autor do livro «Pedras Soltas» e de diversos textos em jornais, revistas, brochuras e catálogos;

- Sócio N.º 1177 da Associação Portuguesa de Escritores

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